Supremo veta trabalho insalubre para gestante

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a norma que admite a possibilidade de trabalhadoras grávidas e lactantes desempenharem atividades insalubres. Essa foi uma das novidades da reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017). O artigo 394-A, incluído na CLT, estipulou que as mulheres só seriam afastadas do trabalho se apresentassem atestado médico com essa recomendação.

As gestantes seriam afastadas de forma automática apenas das atividades insalubres de grau máximo. Para as de grau médio e mínimo, precisariam apresentar declaração médica. Já aquelas em período de amamentação dependiam do atestado também para deixar as atividades insalubres de grau máximo.

Com a decisão do STF, na tarde de ontem, volta a valer a norma anterior à reforma trabalhista, que veda o trabalho de gestantes e lactantes em locais insalubres – sem a necessidade de atestado médico.

Os ministros analisaram a matéria por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.938, apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. Eles entenderam que a nova regra fere direitos garantidos pela Constituição Federal – dentre eles, o direito social à maternidade, à saúde e a condições de trabalho dignas.

Relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, tratou a norma como “absolutamente irrazoável”. “Quem de nós gostaria que nossas filhas ou esposas continuassem a trabalhar em ambientes insalubres? Essa pergunta, ao ser respondida, resolve a questão da constitucionalidade”, disse.

Moraes levou em conta os riscos para a saúde. Ponderou ainda a dificuldade, em certas ocasiões, de a mulher ter acesso ao atestado e também o receio de sofrer consequências ao apresentá-lo para o empregador. “Há o medo de ser demitida posteriormente”, afirmou o ministro no seu voto.

Ele enfatizou que a maternidade não pode ser causa de discriminação e ponderou que justificativas, pela manutenção da regra, relacionadas à retração da participação das mulheres no mercado de trabalho não deveriam prosperar.

A lei prevê, segundo o ministro, que as mulheres sejam realocadas para uma outra função, que não ofereça riscos à saúde, e nos casos em que não for possível a legislação determina que a gestação será considerada de risco e ensejará salário-maternidade.

Alexandre de Moraes já havia deferido liminar, de forma monocrática, no dia 31 de abril, para suspender a norma da reforma trabalhista. Ontem, no plenário, os ministros decidiram o mérito. Marco Aurélio foi o único que divergiu do relator e entendeu pela constitucionalidade da norma.

Ele entende que houve uma “motivação para a reforma trabalhista”. “O impiedoso mercado de trabalho, com oferta excessiva de mão de obra e escassez de empregos”, disse Marco Aurélio, acrescentando que a “visão alargada da proteção ao gênero feminino acaba prejudicando o próprio gênero feminino”.

Especialista na área, a advogada Daniela Mello, do escritório Urbano Vitalino, no entanto, diz que o texto da reforma trabalhista, da forma como foi aprovado, representa “um retrocesso ao direito das mulheres à maternidade e à lactação do seu bebê”.

A advogada Flavia Plycarpo, do escritório Polycarpo Advogados, complementa que desde a redação original da CLT, em 1943, existe a preocupação de se proteger as condições tanto de gênero como de gravidez. O artigo 394-A, diz, foi inserido na CLT em maio de 2016 – ou seja, antes da reforma trabalhista – e o texto original proibia o trabalho da mulher gestante e lactante em ambientes insalubres.

“No relatório do projeto que deu origem à Lei 13.467, nas razões da alteração, justificou-se a inversão da lógica no sentido de se proteger o mercado da mulher pois, na prática, a condição de ser mulher estaria causando restrições e discriminações indiretas nas relações de trabalho”, recorda a advogada. Por mais que a intenção aparentemente fosse boa, acrescenta, o novo texto acabou conflitando com outros artigos da própria CLT, além de ferir direitos garantidos pela Constituição.