Já imaginou receber a notícia de que o sonho da sua vida está prestes a ser realizado, mas que para isso você precisaria se mudar e morar longe de seu marido e suas duas filhas, em outro país? A paranaense Giovana Camargo, nascida em Arapongas, passou pela experiência na pele, e não relutou em escolher a chance de sua vida: viajar para Orlando e cursar a melhor escola de culinária do mundo, a Le Cordon Bleu, em busca do sonho de se tornar uma chef de alta gastronomia. Filha de dono de fábrica de doces e amante da culinária desde criança, a chef Gio, como gosta de ser chamada, sabia da importância dessa oportunidade e contou com o apoio do marido e filhas para mergulhar com tudo na culinária de alto nível; no final, acabou recompensada se tornando peça importantíssima na gastronomia estadunidense.
Mas, até conquistar seu espaço, Giovana passou por diversas experiências e entendeu que o caminho nunca é como esperado. Em sua primeira aula na Le Cordon Bleu, por exemplo, surpreendeu-se com o tema: como fritar batata frita e nugget de frango. “Eu voltei da escola com uma tristeza profunda, não acreditei que depois de tanto trabalho eu cheguei aqui para aprender como fazer frango frito e batata”, conta Giovana. Mas assim como nos bons filmes, a reviravolta magistral veio e fez chef Gio entender uma das principais diferenças entre a gastronomia brasileira e a norte-americana: o pré-preparo do alimento.
Ela explica que a cultura de preparar os alimentos antes de cozinhá-los é a base da gastronomia estadunidense, desde os fast foods até os famosos restaurantes com 5 estrelas; esse fator acelera o procedimento e consequentemente facilita o trabalho dos chefs, viabilizando a alta gastronomia local. “Quando trabalhei no Four Season, um hotel da Disney, por um tempo fiquei responsável pelo café da manhã. Para se ter idéia, o melão, por exemplo, já vinha empacotado e cortado no formato certo. Foi um choque, mas depois que você entende os processos tudo fica mais amplo”, explica a chef Gio, que gosta de brincar chamando essa culinária de “fast alta gastronomia”, ligando os fast foods com os altos níveis da cozinha norte-americana.
Enquanto trabalhava no restaurante do famoso chef americano Emeril Lagasse, Giovana teve oportunidades de apresentar um pouco da cozinha brasileira no restaurante, mas afirmou sempre ter enorme dificuldade em fazer seus pratos serem compreendidos; como foi o caso do pão de queijo, o qual Gio teve a chance de montá-lo em um prato especial de dia dos namorados. Acompanhado de costelinha por dentro e com uma bandeira do Brasil e flores, o prato da chef foi para o cardápio e abriu as portas para novas experiências gastronômicas na Terra do Tio Sam. No mesmo restaurante, chef Gio também foi capaz de mostrar o bobó de camarão e a moqueca. “No início havia muita desconfiança com a culinária brasileira, mas quando conseguia convencê-los a provar eles se surpreendiam; foi muito gingado e atitude”, ressalta Giovana.
Como consequência, a chef começou a ser procurada por marcas brasileiras que desejavam entrar no mercado estadunidense com seus produtos. O primeiro e emblemático caso foi do próprio pão de queijo, quando prestou consultoria para a Forno de Minas. Giovana participou de um programa televisivo onde buscava vender a “ideia” do pão de queijo para os Estados Unidos, semelhante ao que fez no Emeril, apresentando-o como um produto saudável e podendo ser utilizado como lanche para as crianças nas escolas, por exemplo. O trabalho da chef foi um sucesso e hoje é possível encontrar o tradicional pão de queijo nos mais variados supermercados norte-americanos, e não apenas da Forno de Minas. “Posso garantir que outras marcas também estão em todos os supermercados”, afirma.
Projeto semelhante ocorreu com a Mr. Bey, fábrica de doces brasileira que desejava entrar no mercado dos Estados Unidos com suas caixas de petit gateau. A sobremesa, da forma que conhecemos, não era vendida por lá e dificilmente emplacaria nas prateleiras. Com o trabalho de adaptação feito pela chef Gio, foi possível que a Mr. Bey ganhasse espaço nos mercados estadunidenses. O bolo foi apresentado como um tipo de “volcano”, tradicional sobremesa local que era amplamente consumida. Nesse caso, o trabalho de renomear e reapresentar foi a chave para o sucesso; “hoje eles estão em três grandes distribuidoras de alimento, incluindo a US Food, que é a maior daqui”, comemora Gio, que já está em contato com outras marcas nacionais que desejam vender nos EUA.
Além do Emeril, onde trabalhou até 2019, Giovana também teve experiência de quase um semestre no Four Seasons, uma das maiores redes hoteleiras do mundo. Por lá, serviu na área de “banquetes”, trabalhando para grande quantidade de clientes e de diferentes gastronomias. “Tive alguns episódios, com culinária do Catar, do Vietnã, Índia”, lembra a chef, que era a única brasileira trabalhando na rede e era conhecida pela sua versatilidade. Cinco meses depois de ser contratada, Gio teve que voltar ao Brasil para resolver um problema de saúde, mas diz ter portas abertas para retornar ao Four Seasons. “Foi uma fase muito gostosa”, relembra.
Linha de molho gourmet para pizza
Como novidade para 2024, chef Gio está lançando uma linha de molhos gourmet no Brasil em parceria com a Ruah Alimentos. Ela foi contratada para fazer consultoria e também ajudar a alcançar o tempero ideal para o produto, que levou cerca de dois anos para ser finalizado e já superou as expectativas de venda mesmo antes de começar a ser entregue. A previsão agora é que mais de um milhão de unidades sejam adquiridas pelos maiores mercados brasileiros.