Saúde no Brasil testa positivo para Covid-19: tratamento é regulatório e tributário
Eduardo Muniz Machado Cavalcanti e Fábio Ferreira Cunha

 

Eduardo Muniz é advogado e consultor jurídico    

Quando se pensa em sistema de saúde no imaginário popular vem a figura do hospital e seus leitos, com toda a estrutura ao redor, máquinas e equipamentos, médicos, enfermeiros, laboratórios. Essa composição, por si, já exige alto grau de complexidade para seu bom e correto funcionamento, mas é preciso enxergar para além desta disposição contextual, muito além.

Gira em torno da órbita do sistema de saúde um complexo aparelho formado de elementos estruturantes fundamentais para a conexão entre os agentes e o funcionamento desta entrelaçada engrenagem, cujo horizonte é composto por dois protagonistas: a saúde pública e a saúde suplementar.

As peças se encaixam, e a dinâmica do sistema funciona, a partir do reconhecimento de que desde o antecedente em pesquisas, até a fabricação de um medicamento pela indústria farmacêutica, ou sua importação, compreendem o entrelaçado setor de saúde, passando pela distribuição, inserida numa operação logística com todas as espécies de malhas de transporte, especialmente a aérea, com exigências de acondicionamento dos produtos transportados, com rígido controle de fiscalização e inspeções, até alcançar o comércio varejista e atacadista, e, claro, os laboratórios, as clínicas e os hospitais.

Fábio Ferreira Cunha é diretor do Comitê Jurídico da ABRAMED

São, portanto, atores protagonistas deste enredo: os hospitais, os laboratórios, as clínicas, as entidades filantrópicas, os institutos de pesquisas, os fabricantes e importadores de máquinas e equipamentos, as indústrias de alta tecnologia de produtos para a saúde, os distribuidores de produtos e equipamentos médicos, sem deixar de falar das operadoras de planos de saúde, todos eles submetidos a um complexo sistema de regulação do Estado, sujeitos ao controle da ANVISA, ANS, CADE, RFB.

Pois bem! O que parecia complexo se transformou em algo inimaginável. Se esta cadeia de operações em saúde exigia significativo grau de particularidades, com uma logística própria em relação aos demais segmentos produtivos, agora o “maquinário” deve continuar funcionamento mesmo com a sensação de que “jogaram areia” nas engrenagens com a proliferação do COVID-19.

Entre os desafios impostos em tempos de COVID-19, as condutas anticompetitivas são preocupantes porque compreendem a formação de carteis, com acordos de preços, quantidades, regiões e condições de fornecimento; utilização de meios enganosos para provocar oscilações de preços, inclusive com discriminação de adquirentes por meio da fixação de valores ou condições operacionais diferenciadas; imposição de contratos com cláusulas e condições comerciais leoninas; retenção de bens de produção ou de consumo.

Nesta tempestade de desafios impostos pelo novo cenário desenhado pelo COVID-19, ao contrário do que se imagina, o setor de saúde não está “nadando de braçadas” contra a correnteza da crise instalada.

Dados indicam que a medicina diagnóstica fechou centenas de unidades em todo país, com registro de perda de arrecadação da ordem de até 70%. Os hospitais estão com fluxos de caixa comprometidos, com queda de faturamento, sobretudo diante da suspensão dos atendimentos eletivos (consultas, exames e cirurgias), aumento significativo dos preços de insumos, além de sua exponencial utilização (EPI’s), do custo financeiro com empréstimos,  da necessidade de altos investimentos em infraestrutura, especialmente para aumento do número de leitos de Unidade de Tratamento Intensiva (“UTI”), contratação de novos profissionais, aquisição de equipamentos, entre outros fatores.

Com os rumos turbulentos, exigindo um esforço sobrenatural para manter o regular funcionamento desta cadeia produtiva de serviços, o setor vem sendo bombardeado por todos os lados.

Estados e municípios promoveram uma avalanche de requisições administrativas de materiais e produtos relacionados, de forma descoordenada, provocando desabastecimentos e ameaças ao próprio funcionamento de hospitais. No Maranhão, o Decreto n. 35.786, de 04 de maio de 2020, estabeleceu a requisição administrativa de serviços de profissionais da medicina como medida de combate ao COVID-19 sem que houvesse uma sincronização com a saúde suplementar. E se o médico ou enfermeiro no momento da requisição administrativa já tem compromisso com carga horária máxima na rede privada de saúde, como conciliar? E se o médico atender ao chamado de requisição pública e deixar a descoberto o hospital privado? São questões que precisam ser coordenadas, com urgência e prioridade, mas não podem ser desprezadas.

No âmbito do Poder Legislativo, alguns projetos de lei estão em curso no Congresso Nacional que, direta ou indiretamente, afetam o funcionamento do setor de saúde no Brasil, alguns deles já aprovados e em vigor, fincando diretrizes favoráveis.

A Lei n. 13.989, de 15 de abril de 2020, estabelece a utilização da telemedicina durante a pandemia do COVID-19, cuja permissão alcança o uso da tecnologia para realização de atendimento médico sem necessidade de proximidade física com o paciente. O texto original previa a regulamentação da telemedicina pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), após o período de crise causado pelo COVID-19, porém houve veto neste ponto sob o fundamento de que as atividades médicas por vias remotas devem ser reguladas por lei após o fim da pandemia. Diante do rumo que a sociedade está tomando, inevitável que este tema volte à pauta, inclusive, e sobretudo, pós COVID-19. É preciso evoluir, de forma segura e eficiente, proporcionando bem-estar a todos.

O PL 2324/2020, que trata do uso compulsório de leitos privados, que já conta com aprovação no Senado Federal em 26 de maio, até o momento aguardando votação na Câmara dos Deputados, prevê condições à requisição administrativa de leitos hospitalares privados de UTI, para fins de internação de pacientes com COVID-19, entre as quais, as seguintes: i) os serviços hospitalares poderão ser submetidos ao uso compulsório pelo poder público desde que estejam com taxa de ocupação inferior a 85%; ii) prévia negociação entre os gestores do SUS e as instituições privadas para contratação emergencial dos leitos disponíveis, mediante chamamento público que contenha quantidade e prazo de utilização dos leitos, além de valores de referência, cotados no mercado; iii) regulação dos leitos a cargo da Comissão Intergestora Bipartite (CIB); e, iv) justa indenização pelo uso compulsório dos leitos privados ociosos terá como referência ato do Ministério da Saúde ou será definida pelo colegiado da CIB, com base nos valores de referência do mercado.

No âmbito fiscal, o Governo Federal editou a Resolução CAMEX nº 17/2020, promovendo a redução temporária da alíquota do imposto de importação para álcool etílico, desinfetantes, vestuários, acessórios de proteção e outros, com a redução a zero das alíquotas do Imposto de Importação para produtos médico-hospitalares.

Os Decretos ns. 10.285 e 10.302/2020, tratam da desoneração temporária do IPI para produtos essenciais no combate à COVID-19, com redução a zero das alíquotas do imposto para álcool etílico, desinfetantes, gel antisséptico, vestuário e acessórios de proteção, aparelhos de eletrodiagnóstico, aparelhos de oxigenoterapia e outros, além da redução a zero das alíquotas do referido imposto incidentes sobre: (i) artigos de laboratório ou de farmácia; (ii) luvas, mitenes e semelhantes, exceto para cirurgia; e (iii) termômetros clínicos.

Não obstante este tímido avanço, é indispensável pensar em uma rede de proteção regulatória e fiscal própria ao setor de saúde sob pena de colapso geral do sistema.

Não é crível, nem muito menos adequado, pensar a saúde como uma fórmula genérica e sob dosagem uniforme aplicada a todos os segmentos de atividades econômicas.

Recentemente na MP 936/20, por meio de projeto de conversão em lei, discutiu-se na Câmara dos Deputados, por apoio das lideranças, a prorrogação da desoneração da folha pela contribuição previdenciária sobre receita bruta (CPRB), ao invés da incidência sobre a folha de salários, a diversas atividades econômicas, sem que o setor de saúde tenha sido contemplado, muito embora ainda se aguarde a sanção, ou veto, do Presidente da República.

A postergação de recolhimento de tributos federais deve alcançar, inclusive, aqueles sujeitos à retenção na fonte, e não somente do INSS Patronal e do PIS/COFINS por um par de meses, bem como a prorrogação do cumprimento de todas as obrigações acessórias relativas a tributos federais, e não somente da DCTF e da EFD-Contribuições, até final do ano. Adoção do regime de caixa para fins de recolhimento do PIS/COFINS. Abatimento integral de prejuízos fiscais e redução a zero de PIS/COFINS sobre produtos médico-hospitalares.

Do atual cenário, pouco se enxerga medidas legais com viés fomentador, cujos aspectos regulatórios e fiscais estejam relacionados à cadeia produtiva e de serviços do setor de saúde. As medidas tributárias de alívio, muitas vezes de suspiro, tais como diferimentos ou prorrogações de tributos (não se trata de dispensa do pagamento), ou até mesmo monetárias (de linha de crédito), são as mesmas direcionadas a outros setores, desconsiderando que a saúde, para além de direito fundamental, está sendo extremamente castigada pelo COVID-19 e, somente por meio dela, como ator principal deste enredo, poderemos superar os impactos mais letais desta pandemia.

Ministro do STF manda governo divulgar dados totais de covid-19
Moraes classificou a pandemia de “ameaça real e gravíssima”

Da Agência Brasil

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o governo federal divulgue na íntegra os dados relativos ao contágio e às mortes pelo novo coronavírus (covid-19), nos moldes de como vinha sendo realizado pelo Ministério da Saúde até o dia 4 de junho.

O magistrado atendeu a um pedido de liminar (decisão provisória) feito pelos partidos Rede Sustentabilidade, PCdoB e Psol em uma ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Na decisão, Moraes classificou a pandemia de “ameaça real e gravíssima” e destacou que há mais de 36 mil mortes no Brasil em decorrência do novo coronavírus.

O ministro afirmou que as consequências para a população podem ser desastrosas “caso não sejam adotadas medidas de efetividade internacionalmente reconhecidas, dentre elas, a coleta, análise, armazenamento e divulgação de relevantes dados epidemiológicos necessários, tanto ao planejamento do poder público para tomada de decisões e encaminhamento de políticas públicas, quanto do pleno acesso da população para efetivo conhecimento da situação vivenciada no país”.

Pela decisão, o Ministério da Saúde fica obrigado a divulgar e manter uma divulgação diária e integral dos dados epidemiológicos relativos à pandemia, incluindo o número acumulado de contaminados e mortos.

Para Moraes, isso é necessário para que sejam cumpridos “os princípios constitucionais da publicidade e transparência e do dever constitucional de executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica em defesa da vida e da saúde”.

Entenda o caso

Na noite de domingo (7), o Ministério da Saúde anunciou uma mudança no formato de divulgação dos dados relativos à pandemia. Pela nova metodologia, por exemplo, em vez de divulgar o número de mortes acumuladas na data de notificação, passa a ser divulgado com maior destaque somente o número de mortes que efetivamente ocorreram naquele dia.

A explicação dada pelo governo foi de que a divulgação do acúmulo de casos, como vinha sendo feito, dificulta a verificação das mudanças dos cenários regionais, estaduais e municipais.

“O uso da data de ocorrência (e não da data de registro) auxiliará a se ter um panorama mais realista do que ocorre em nível nacional e favorecerá a predição, criando condições para a adoção de medidas mais adequadas para o enfrentamento da covid-19, nos âmbitos regional e nacional”, disse o ministério em comunicado divulgado na noite de domingo (7).

Ontem (8), o governo fez outro anúncio sobre a criação de uma nova plataforma interativa com os dados, que deve ser lançada nesta semana. Segundo o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, as secretarias estaduais enviarão as informações até as 16h e os dados totais nacionais serão divulgados até as 18h30.

Em entrevista coletiva, o diretor do Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis, Eduardo Macário, disse que as mortes por covid-19 confirmadas com dias de atraso continuarão a ser contabilizadas, mas que o dia de ocorrência será considerado e isso impactará a curva epidemiológica de evolução da pandemia. “O total continua o total”, afirmou.

MPF

O Ministério Público Federal (MPF)instaurou, no sábado (6), procedimento extrajudicial para apurar porque o Ministério da Saúde mudou a forma de divulgação dos dados do novo coronavírus no Brasil. O MPF pedirá ao ministério a cópia do ato administrativo que determinou a retirada do número acumulado de mortes do painel, bem como do inteiro teor do procedimento administrativo que resultou na adoção da medida.

Último balanço

De acordo com o último balanço divulgado pelo governo federal na noite de ontem (8), o Brasil registrou na  segunda-feira 15.654 novos casos de covid-19 e 679 novas mortes.

Com isso, os totais subiram para 707.412 casos confirmados da doença e 37.134 mortes.

Divulgação paralela

Em meio a essas mudanças, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) disponibilizou ontem(7), em seu site, um painel próprio com dados atualizados sobre o número de casos da covid-19 no país. A atualização feita ontem mostra 679 novas mortes e 15.564 novos casos de covid-19 nas últimas 24 horas.

De acordo com a entidade, a iniciativa está pautada “pelo mais alto interesse público”, com vista à “defesa da saúde e da vida” dos brasileiros.

As informações da nova ferramenta serão fornecidas pelos estados e estarão disponíveis diariamente até as 18h. O conselho reúne os secretários de saúde das 27 unidades da federação.

Especialistas alertam sobre sintomas menos comuns da covid-19
Perda de olfato e paladar pode ocorrer em mais de 20% dos casos

Com a evolução da pandemia do novo coronavírus (covid-19), autoridades de saúde chamam a atenção para os sintomas da doença, especialmente os mais comuns. Mas outras manifestações também podem ser um indicativo da doença e devem ser motivo de alerta.

Em sua página especial com informações sobre o novo coronavírus, o Ministério da Saúde lista os sintomas da doença gerada pelo vírus: tosse, febre, coriza, dor de garganta e dificuldades respiratórias.

Mas pesquisas revelaram outros sinais. Entre eles a perda de olfato e de paladar. Segundo o presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF), Farid Buitrago, essas manifestações ocorrem em 20% a 30% dos casos que apresentam sintomas.

“Este sintomas não são muito comuns, mas quando acontece a pessoa deve ficar atenta porque pode ser uma das manifestações do coronavírus. Associado a isso, se tiver febre, tosse e dor de garganta já fecha o diagnóstico”, alerta o médico.

Ele conta que a atenção a esses sintomas é um indicativo importante para o novo coronavírus porque são raras as condições que provocam essas alterações. “Eventualmente alguma doença pode causar isso, como tumores. Gripes comuns podem causar estes sintomas, mas é menos comum”, comenta o presidente do CRM-DF.

Caso a pessoa verifique estes sintomas, a orientação é a mesma para os demais: procurar uma unidade de saúde na atenção básica, os chamados postos de saúde. Nestes locais os profissionais encaminham a testagem e, em situações mais graves, para um atendimento em unidades de pronto atendimento ou hospitais.

Outros sintomas

O médico Farid Buitrago destaca que há outros sintomas, ainda menos comuns. Entre eles conjuntivite, náuseas e alterações gastro-intestinais, como dor de estômago e diarreia. Para conjuntivite, estudos mostraram a ocorrência em cerca de 10% dos casos.

“Tem outro que também se fala muito pouco que são alterações da pele. A Sociedade Espanhola de Dermatologia elaborou atlas para mostrar lesões na pele para pacientes de coronavírus. Desde manchas vermelhas até que parecem como queimaduras de fogo ou de gelo. Essas marcas estão presentes nos pés e mãos, em pessoas jovens”, relata o presidente do CRM-DF.

Hidroxicloroquina na Covid-19: a responsabilidade do médico e da instituição
Joberto Acioli *

Joberto Acioli é médico e advogado do Pessoa & Pessoa Advogados Associados

Resultados excelentes obtidos em laboratório com o uso da Hidroxicloroquina, com doses inalcançáveis em seres humanos, trouxeram a possibilidade teórica de sua utilização como tratamento de pacientes com a Covid-19. Este achado trouxe-nos a um cenário surreal onde todas as pessoas, mesmo sem nenhuma formação médica ou científica, sentem-se aptas a opinar e até mesmo decidir sobre o uso desta terapêutica, frise-se, experimental.

Medicamentos têm efeitos desejáveis e também efeitos prejudiciais, devendo este fato ser ponderado pelo médico ao intervir, já que, ao alterar ou ao não alterar o curso da doença em um paciente sob seus cuidados, o médico toma para si, e para a instituição ao qual é vinculado, alguma responsabilidade sobre o desfecho do evento.

A Hidroxicloroquina é uma droga de uso autorizado pela Anvisa para o tratamento de outras doenças. Seu uso, no cenário atual, é entendido como um uso off-label e experimental.

O SARS-Cov-2 é um novo coronavírus identificado como agente etiológico da pandemia de Covid-19. Pessoas que testam positivo para o vírus podem evoluir sem sintomas, desenvolver doença leve, moderada ou severa e, mesmo, vir a óbito.

Segundo a Organização Panamericana da Saúde (OPAS), mesmo sem nenhuma terapêutica específica, mais de 80% dos casos evolui para a cura, sem necessitar de internamento e sem usar nenhum medicamento específico[1]. Daí a dificuldade em se confirmar a eficácia de qualquer terapêutica sem um estudo científico adequadamente elaborado, não sendo cientificamente válidos, relatos de que “muitos pacientes” usando esta ou aquela medicação sobreviveram, já que mais de 80% também evoluiriam bem.

Direciona-se aqui o foco da discussão para a responsabilidade inerente ao médico ou à instituição que adota a prescrição da Hidroxicloroquina para seus pacientes e em que medida se encontram obrigados a ressarcir eventuais danos decorrentes desta tentativa de tratamento ou os danos decorrentes da não utilização deste fármaco.

Conforme já explicado, a prescrição de terapêutica específica no tratamento da Covid-19 é experimental, necessitando, obrigatoriamente, seguir a clara regulamentação contida especialmente no Capítulo XII do Código de Ética Médica (CEM) neste sentido. Nos Art. 100 e 101 e no Parágrafo Único do Art. 102.[2], está disposto que a autorização por órgãos competentes, a exemplo do Ministério da Saúde, é obrigatória, mas não suficiente.

Nos trechos supracitados, identifica-se ao menos três requisitos cumulativos necessários para o uso experimental de uma terapêutica em humanos, quais sejam: (i) a existência de protocolo aprovado, (ii) a aceitação por órgãos competentes e (iii) a obtenção de consentimento livre e esclarecido para a realização da pesquisa.

Ou seja, o médico não está autorizado a utilizar qualquer medicamento, de forma experimental, na dose que desejar e no momento que desejar!

Há critérios para esta e qualquer outra pesquisa com seres humanos e tais critérios precisam ser respeitados, de forma a preservar-se a dignidade da pessoa humana. Não é autorizada a livre prescrição de nenhum medicamento. Ao abrir mão destes limites, o médico torna-se, sim, vulnerável à responsabilização por eventuais resultados negativos decorrentes de sua conduta.

Também, levando-se em conta o princípio bioético da autonomia do paciente é obrigatória a anuência do paciente ao tratamento experimental, o que deve ser precedido de informação suficiente sobre efeitos colaterais do tratamento e possíveis resultados adversos, sem menosprezá-los ou majorá-los, incluídos os danos à visão e risco de arritmias letais.

Neste ponto cumpre lembrar, também, que nenhum médico é obrigado a prescrever a medicação experimental, sem respaldo científico para seu uso e sem reconhecimento, em nenhum país, como droga eficaz no tratamento da Covid-19.

O médico tem uma obrigação de meio, e não de resultado, devendo colocar à disposição do paciente todos os recursos, sem perder de vista que a cura não pode ser um compromisso, já que organismos vivos não respondem matematicamente, e resultados adversos podem ocorrer.

Em uma situação de dano ao paciente, será avaliada a responsabilidade do médico e da instituição à qual ele está associado e os fatos serão apurados conforme se mostram, de forma objetiva, cabendo que, no momento da prescrição, sejam avaliados de igual maneira, sem o açodamento nem emoções, dois inimigos de decisões médicas.

Outrossim, são frequentes as acusações de erro médico, pelo que se recomenda, fortemente, a aplicação dos Termos de consentimento para os vários atos médicos praticados no decorrer da relação médico-paciente. Esta formalização das explicações feitas mesmo para atos protocolares já arraigados é uma realidade à qual é preciso se ajustar e se acostumar.

[1] https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875

[2] (É vedado ao médico:) ART. 100. Deixar de obter aprovação de protocolo para a realização de pesquisa em seres humanos, de acordo com a legislação vigente.

Art. 101. Deixar de obter do paciente ou de seu representante legal o termo de consentimento livre e esclarecido para a realização de pesquisa envolvendo seres humanos, após as devidas explicações sobre a natureza e as consequências da pesquisa.

ART. 102. § único. A utilização de terapêutica experimental é permitida quando aceita pelos órgãos competentes e com o consentimento do paciente ou de seu representante legal, adequadamente esclarecidos da situação e das possíveis consequências.