Censo aéreo confirma recuperação da população de baleias jubarte
Número de animais recuperados é comparável ao de 200 anos atrás

Da Agência Brasil

O mais recente monitoramento aéreo feito pelo Instituto Baleia Jubarte, que cobriu uma distância de 6.200 quilômetros entre a divisa do Ceará com o Rio Grande do Norte até o litoral norte de São Paulo, confirmou a recuperação da população brasileira desses mamíferos marinhos, estimada em 25 mil animais na temporada 2022. O número é comparável ao total existente há 200 anos, quando a população estava entre 27 mil e 30 mil mamíferos da espécie em águas brasileiras.

Realizado em agosto deste ano em parceria com a empresa Socioambiental e com apoio financeiro da Veracel Celulose e da Petrobras, o censo confirmou que a população brasileira da espécie se encontra perto da recuperação total.

Feito a cada três anos, o monitoramento aéreo tem o objetivo de estimar a população de baleias jubartes que visitam o litoral do país. O monitoramento é realizado com aeronaves especiais e adequadas para o avistamento de baleias desde 2003, quando a parceria começou e foram registradas 3.660 jubartes. O levantamento feito este ano foi realizado desde a costa até o mar aberto, em águas com profundidade de 500 metros.

O resultado é motivo de grande comemoração, diz o biólogo Enrico Marcovaldi, um dos fundadores do Projeto Baleia Jubarte. “Depois de décadas de atuação na proteção das baleias, ver essa população quase totalmente recuperada dá uma enorme alegria e uma sensação de dever quase cumprido. Quase, porque sempre temos que atuar para evitar que as baleias voltem a ser ameaçadas por impactos das atividades humanas.”

Berçário

As jubartes ficam de junho a novembro no país, em especial na região de Abrolhos, sul da Bahia, que constitui importante berçário da espécie na costa brasileira. Segundo a bióloga Márcia Engel, coordenadora do monitoramento aéreo, este foi o estudo de mais longo prazo já realizado com uma população de baleias no Brasil e permitiu acompanhar, a cada ano, não apenas a recuperação do número de animais da espécie, como a forma como ela foi reocupando nossas águas territoriais.

“Foi baseado nos resultados deste monitoramento que o Ministério do Meio Ambiente, em 2014, retirou a baleia jubarte da Lista Nacional de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção”, destacou a bióloga.

De acordo com o Instituto Baleia Jubarte, o monitoramento das baleias ao longo dos anos foi determinante para a adoção de medidas que ajudaram na preservação da espécie, em especial na época da reprodução. O mapeamento de densidade permite identificar os locais de concentração de baleias, o que é importante para localizar a rota de navegação das barcaças de celulose em áreas com a menor presença desses mamíferos, reduzindo os riscos de colisão.

As baleias jubarte que nascem em águas brasileiras passam o inverno e a primavera no país. Em outubro, o animal que veio só acasalar e ainda está sem filhote, assim como alguns machos, já começa a migrar, visando chegar logo à área de alimentação na Antártida.

Já os animais que têm filhotes no litoral brasileiro ficam até novembro. É o tempo para o filhote desenvolver a camada de gordura para enfrentar as áreas subantárticas, onde conseguirá alimentação, além de ganhar mais músculos para acompanhar a mãe, informou Milton Marcondes, médico veterinário e coordenador de pesquisa do Instituto Baleia Jubarte.

Por ter muitos arrecifes e outras áreas mais protegidas, como o Arquipélago de Abrolhos, o sul da Bahia e o norte do Espírito Santo são as regiões do litoral brasileiro mais procuradas pelas jubartes para ter os filhotes, que ficam naturalmente mais protegidos.

A caça da jubarte foi proibida em 1966 no Brasil, mas em diferentes estados ainda era muito praticada. Em 1986, uma moratória internacional proibiu a caça comercial por cinco anos. Somente em 1987, contudo, o país ganhou uma lei proibindo nacionalmente a caça às baleias jubarte.

Recuperação da Bacia do Rio Doce custará bilhões, avalia presidente de comitê

rio doce recuperacao
Recuperação do Rio Doce tem tido a participação de moradores da região                     José Cruz/Agência Brasil

O Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce) trabalha na solução dos problemas de água na região, que inclui os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, unindo a sociedade civil, o poder público e os usuários que têm atuação e/ou moram na bacia. Sua atuação ganhou evidência após o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (MG), em novembro de 2015.

A presidente do CBH-Doce, a bióloga Lucinha Teixeira, disse, em entrevista por e-mail à Agência Brasil, que a recuperação da bacia e do seu meio ambiente custará bilhões de reais. Segundo a bióloga, o diálogo entre poder público, organizações da sociedade civil e comitês de usuários no âmbito dos comitês de bacias é um caso de sucesso e tem sido efetivo na solução da crise desse recurso limitado que é a água.

Atuante no comitê há 12 anos, Lucinha apresentará, no 8º Fórum Mundial da Água, que começa neste domingo (18) em Brasília, diversas ações para recuperar a bacia, como os cuidados com os lençóis freáticos, a otimização da irrigação e a diminuição do envio de sedimentos para os rios.

Agência Brasil: O que o CBH-Doce vai trazer para o Fórum Mundial da Água?

Lucinha Teixeira:  Vamos apresentar um relato sobre a situação da Bacia do Rio Doce, antes do rompimento da Barragem de Fundão, da mineradora Samarco, além dos resultados já alcançados com os programas e projetos executados pelos Comitês, para melhoria da qualidade e da quantidade de água. Entre as nossas ações, destacamos a elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico para 165 municípios da bacia, por meio do Programa de Universalização do Saneamento, desenvolvido pelos CBHs do Rio Doce, com o apoio da agência de água da Bacia do Rio Doce, o Ibio [Instituto BioAtlântica]. Investimos mais de R$ 20 milhões na contratação de empresas especializadas na construção dos PMSBs [Planos Municipais de Saneamento Básico] e, com isso, auxiliamos municípios – que não possuíam recursos e nem corpo técnico para elaboração dos planos – a avançar no que diz respeito ao saneamento básico, um dos principais problemas ambientais da bacia.

Agência Brasil: Na prática, quais são os resultados?

Lucinha Teixeira:  No Espírito Santo, em uma junção de esforços com o estado, o Ibio e a iniciativa privada, está em fase de finalização a elaboração de projetos de adequação ambiental e do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de 600 propriedades rurais. Os produtores participantes, a partir da doação de insumos, ficam responsáveis pelas intervenções, como cercamento de olhos d’água [locais onde o lençol freático aflora e a água aparece na superfície] e reflorestamento de áreas de recarga [onde a água se infiltra no solo para reabastecer o lençol freático] e, depois, recebem pelo Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).

Outra iniciativa promove, via instalação e customização de um equipamento que indica quando e quanto irrigar, o irrigâmetro, o uso consciente dos recursos hídricos no campo. Mais de 200 propriedades, em Minas e no Espírito Santo, receberam gratuitamente o aparelho e, em alguns casos, a economia de água e energia foi superior a 70%, além da melhoria da qualidade dos produtos cultivados.

Além disso, está em fase inicial de implementação o Rio Vivo, conjunto de ações ambientais com foco no incremento da disponibilidade hídrica, promoção do saneamento rural e diminuição da geração de sedimentos. O Rio Vivo já em execução nas bacias dos rios Piranga, Piracicaba/MG, Santo Antônio e Suaçuí e será estendido a toda a Bacia do Rio Doce, com previsão de investimentos de R$ 100 milhões até 2020.

Agência Brasil: O desastre ambiental de Mariana teve um impacto muito grande. Como tem sido a recuperação e em que medida esse trabalho terá repercussões em outros locais que passaram ou correm o risco de passar pelo mesmo problema? Qual é o papel do CBH-Doce nesse contexto?

Lucinha Teixeira:  Os Comitês de Bacias Hidrográficas – entre eles o CBH-Doce – são órgãos de Estado, criados por decreto federal do presidente da República, nos quais estão inseridos a sociedade civil, o poder público e os usuários que têm atuação e/ou moram na bacia.

Os CBHs fazem parte do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, ao qual também pertencem o Ministério do Meio Ambiente, a Agência Nacional de Águas, etc. Temos buscado fortalecer a participação do CBH-Doce e dos demais comitês de bacias hidrográficas com atuação na bacia do rio Doce no processo de recuperação, trazendo para o debate com os comitês as discussões tratadas no âmbito da governança estabelecida por acordo entre empresas e governo federal e estadual – o Comitê Interfederativo (CIF). Embora o CBH-Doce faça parte do CIF, existem outros 11 comitês de bacias de rios afluentes ao Rio Doce atuando de forma integrada na promoção de ações que melhorem a quantidade e qualidade de águas.

Agência Brasil: Em que a atuação do CBH-Doce, e especialmente os trabalhos de recuperação da área atingida perlo desastre de Mariana, podem servir para outros países e o próprio Brasil?

Lucinha Teixeira: A Bacia do Rio Doce, que antes desse desastre já apresentava situação ambiental preocupante, necessita de investimentos de bilhões de reais para resultados expressivos no que diz respeito à questão hídrica e a melhorias do meio ambiente, de maneira ampla. Apesar de insuficientes, os recursos da cobrança pelo uso da água já nos permitem fazer um trabalho com resultados cada vez melhores, focados no incremento hídrico, na promoção do saneamento rural e urbano, no incentivo ao uso racional da água, entre outros. Acredito que o trabalho dos comitês de bacia no Rio Doce pode ser mostrado como um caso de sucesso na medida em que, mesmo em um território altamente degradado, com casos de conflito pelo uso da água e com recursos limitados, bons resultados têm se apresentado, diante da aplicação eficiente dos recursos e da gestão democrática e participativa das águas.

Agência Brasil: Os esforços em prol do meio ambiente acabam esbarrando em descuidos que por sua vez vão dar em novos desastres como esse da ruptura do mineroduto da empresa britânica Anglo American, ocorrida no último dia 12. Como um Comitê de Bacia Hidrografica lida com isso?

Lucinha Teixeira: Os Comitês da Bacia Hidrográfica do Rio Doce estão cumprindo seu papel de interlocutor entre a comunidade e os entes fiscalizadores, reguladores e de gestão. Estamos em contato direto com a Copasa, a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), o Ministério Público, a mineradora Anglo American e demais órgãos ambientais que estão atuando na região. E reiteramos a necessidade da junção de esforços para que as comunidades impactadas sejam devidamente atendidas, com o restabelecimento do abastecimento humano e reparação dos danos ambientais resultantes do despejo de minério.