STF reafirma legalidade da terceirização para atividade-fim em empresa

O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou hoje (11) entendimento favorável à constitucionalidade da terceirização da contratação de trabalhadores para a atividade-fim das empresas.

Em agosto, a Corte liberou a terceirização irrestrita em todos os setores das empresas privadas. No entanto, vários recursos continuaram chegando ao tribunal com base no entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que proibia a prática.

Ao julgar um caso concreto nesta tarde, por 7 votos 4 o colegiado aceitou recurso a favor de empresas de telefonia para liberar a terceirização em suas atividades de call center (central de atendimento), conforme o entendimento firmado anteriormente pela Corte.

A terceirização ocorre quando uma empresa decide contratar uma outra para prestar determinado serviço, com o objetivo de cortar custos. Dessa forma, não há contratação direta dos empregados pela tomadora do serviço.

Em agosto, a Corte julgou duas ações que chegaram ao tribunal antes da sanção da Lei da Terceirização, em março de 2017, que liberou a terceirização para todas as atividades das empresas.

Apesar da sanção, a Súmula 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), editada em 2011, que proibia a terceirização das atividades-fim das empresas, continuou em validade e foi aplicada pela Justiça trabalhista nos contratos que foram assinados e encerrados antes da lei.

Decisão do STF acerca da terceirização traz mais segurança jurídica

O Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria de votos (07 a 04), reconheceu a licitude da terceirização de atividade meio e fim das empresas, com a aprovação de tese de repercussão geral. Antes da lei da terceirização, a jurisprudência do TST (Tribunal Superior do Trabalho) indicava vedação à terceirização da atividade-fim da empresa e permitia a contratação para atividades-meio. Empresários alegavam que a definição e distinção entre o que seria atividade-fim e atividade-meio causavam confusão, inclusive na justiça do trabalho.

De acordo com o advogado trabalhista Bruno Okajima, sócio do Autuori Burmann Sociedade de Advogados, é importante esclarecer que a aprovação de tese de repercussão geral tem como principal objetivo a uniformização da interpretação de determinada matéria por parte do STF e deve ser observada pelos demais órgãos do Poder Judiciário, especialmente para a garantia da segurança jurídica.

“Antes de 31/03/2017 – data da entrada em vigor da Lei da Terceirização -, diante da inexistência de lei proibindo ou autorizando a terceirização no Brasil, o tema era regulamentado pela Súmula n.º 331, do TST, que, em síntese, considerava lícita a terceirização de serviços de vigilância, conservação e limpeza, bem como os especializados relacionados à atividade-meio das empresas, desde que não estivessem presentes entre os empregados da empresa contratada (prestadora) e o do contratante (tomadora) os requisitos da pessoalidade e subordinação direta. Nessa hipótese, a tomadora de serviços responderia apenas subsidiariamente, caso a real empregadora (prestadora) não arcasse com as suas obrigações”, afirma.

Nas hipóteses de contratação de atividades diversas daquelas indicadas anteriormente (atividade fim), o entendimento predominante era o de que a terceirização era ilícita e a Justiça do Trabalho reconhecia o vínculo de emprego do empregado da prestadora de serviços diretamente com a tomadora, exceto quando se tratavam de órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional.

“Assim, com base no entendimento do TST, a análise das ações relacionadas à terceirização era simples: se a contratação era relacionada a serviços de vigilância, conservação e limpeza e/ou outros especializados relacionados à atividade-meio, a terceirização era considerada lícita e a responsabilidade do tomador de serviços era subsidiária. Fora de tais hipóteses, a terceirização era considerada ilícita e o tomador de serviços era considerado o empregador”.

Com a entrada em vigor da Lei n.º 13.429/2017, a terceirização passou ser regulamentada no Brasil, mas o entendimento do TST, conforme decisão proferida pela Seção de Direitos Individuais 1 (SDI-1), foi o de que a Súmula n.º 331 continuava sendo aplicada às relações de emprego iniciadas e regidas pela lei anterior – ou ausência dela.

A partir da decisão do STF, o entendimento consolidado na Súmula n.º 331, do TST, deve deixar de ser aplicado, de forma que os julgadores deverão considerar lícita toda forma de terceirização e a responsabilidade da tomadora de serviços será apenas subsidiária.

Impactos da decisão

Para Okajima, diante da limitação da análise do STF a situação anterior à entrada em vigor da Lei da Terceirização, que passou a autorizar expressamente a terceirização irrestrita, o maior impacto da aprovação da tese de repercussão geral será na forma de responsabilização das empresas que já terceirizavam a sua atividade fim – ainda que parcialmente – antes da entrada em vigor da nova lei e que estavam sujeitas ao entendimento consolidado pelo TST por meio da Súmula n.º 331. Os julgadores terão que reconhecer a licitude de tal terceirização e limitar a forma de responsabilização das tomadoras de serviço (subsidiária). Na prática, ainda vai ser possível o reconhecimento de vínculo direto de emprego entre o empregado da prestadora de serviços e o da tomadora se os julgadores vislumbrarem a fraude na terceirização – apenas para mascarar a relação de emprego.

“Uma questão polêmica levantada ao final do julgamento foi a possibilidade de eventual modulação dos efeitos da decisão proferida, especialmente para a definição da aplicação do entendimento em ações já transitadas em julgado, mas que se referem a obrigações com repercussão futura. A maioria dos Ministros, apenas a título de esclarecimento,  manifestou-se no sentido de respeitar a coisa julgada, sem prejuízo de efeitos futuros, porém, a decisão final foi a de que a questão deverá ser tratada em eventuais embargos de declaração, pois não era objeto do julgamento naquele momento”, acrescenta.

De todo modo, a decisão terá bastante impacto especialmente em decisões que proibiam determinadas empresas de terceirizar a atividade fim – com efeitos futuros e ilimitados -, já que, com a aprovação da tese em sentido contrário pelo STF, tal decisão deverá ser revista ou considerada superada, a depender do posicionamento dos Ministros na discussão, em sede de embargos de declaração, da modulação dos efeitos. “O mesmo se aplicará aos Termos de Ajuste de Conduta firmados com o MPT e que contêm proibição expressa de terceirização de atividade fim ou meio”, finaliza.

Supremo debate amanhã descriminalização do aborto

Debaixo das atenções femininas e com a expectativa de polêmicas fervorosas, o aborto volta a ser debatido no Supremo Tribunal Federal (STF) amanhã (3), ainda sob o comando da segunda presidente mulher da Corte, Cármen Lúcia. O tema será relatado por Rosa Weber que decidiu ouvir especialistas antes de emitir um parecer.

O STF tem nas mãos uma ação encaminhada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), em março de 2017, pedindo que a interrupção da gravidez feita por decisão da mulher nas 12 primeiras semanas não seja mais considerada um crime. Mais de 40 pessoas ligadas às áreas de saúde, ciências, direitos humanos e religião foram escolhidas para participar dos debates.

A primeira audiência pública está marcada para esta sexta-feira (3) e deve contar com mais de 20 especialistas. Cada um terá 20 minutos para apresentar argumentos e posicionamentos sobre o tema. Uma nova rodada está marcada para 6 de agosto.

Depois dessas audiências, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que já antecipou que não se manifestará antes do fim do processo, terá que emitir um parecer. Pela rotina do STF, a manifestação da PGR costuma ser apresentada em até dez dias, mas não há um prazo pré-definido. Apenas com esse relatório em mãos, Rosa Weber concluirá seu posicionamento sobre o tema e submeterá a decisão ao plenário do STF – onde os 11 ministros deverão apresentar seu voto.

Como se trata de uma questão complexa, assessores da Corte acreditam que dificilmente a atual presidente do Supremo tenha tempo hábil para colocar em pauta. A partir de setembro, Dias Toffoli passa a comandar o tribunal.

Em cada turno dos dois dias de debate estão garantidas falas contrárias e favoráveis à descriminalização.

Favorável

Responsável pela ação que, em 2012, garantiu o direito legal ao aborto nos casos de anencefalia, a professora da Universidade de Brasília (UnB) Débora Diniz diz que a descriminalização retira a punição que recai sobre a mulher.

Segundo ela, descriminalizar significa retirar a investigação, o estigma e a perseguição contra vítimas, em geral, mulheres mais jovens, pobres, negras, de áreas rurais, com menor acesso à informação e com menor poder aquisitivo para acessar clínicas e medicamentos seguros.

“A criminalização é um marco de desproteção às mulheres mais vulneráveis e mais desfavorecidas do país. Estamos falando de meninas violentadas que engravidam de maneira involuntária, de mulheres sem acesso à informação ou que fazem mau uso de métodos de planejamento familiar, ou de mulheres muito jovens que já têm filhos e se encontram em situação que não podem mais ter filhos”, alertou a pesquisadora.

“A minha pergunta é: como olhar para estas mulheres desfavorecidas, frágeis e em situação de violência e colocar a polícia atrás delas por uma decisão de vida? Devo ou não viver em um Estado que prenda as mulheres – mulheres comuns, uma em cada cinco, ou uma jovem que sofreu violência em casa? Se ela diz que não pode manter a gestação, ainda pego e coloco ela dentro de uma prisão por 3 ou 4 anos?”, completou.

A pesquisadora ressaltou ainda que esta decisão não obriga mulheres contrárias à prática do aborto, mas garante às outras a liberdade de se submeter a esse procedimento de uma forma segura e livre.

De acordo com a especialista, uma em cada cinco mulheres brasileiras de 40 anos de idade já fez pelo menos um aborto. Ainda segundo ela, em 2015, foram mais de 500 mil mulheres brasileiras se submetendo a esse procedimento. “A questão é constitucional e importante para a democracia. Esta é parte de uma dívida democrática com as mulheres”, analisou.

Outro lado

Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entretanto, o tema deveria ser discutido no Legislativo. Na opinião da entidade, o assunto contaria com uma participação popular mais expressiva se fosse discutido no Congresso Nacional.

Para dom Ricardo Hoepers, bispo de Rio Grande (RS), a discussão restrita ao Supremo é “um transtorno democrático porque impede um aprofundamento do debate e a participação efetiva da população”.

Mestre e doutor em Bioética e Teologia Moral na Academia Alfonsiana, em Roma, Hoepers defende que o debate sobre o aborto é uma questão social e não apenas religiosa. Ele destaca ainda que a CNBB é uma instituição que faz parte da história democrática do país e, por isso, deve ter espaço para defender sua posição. Segundo o bispo, seu papel será o de ressaltar a reflexão em defesa da vida.

“Entendemos, baseado na proposta científica, que a vida começa na concepção. Este pedido é desproporcional. Temos que defender a vida da mulher, mas não podemos suprimir a vida da criança. Não se resolve um mal com outro mal”, defendeu.

Dom Hoerpers reconhece o drama de milhares de mulheres que tentam o aborto de forma ilegal e que acabam morrendo durante o procedimento. Segundo ele, esse problema poderia ser sanado com políticas públicas integrais de proteção à maternidade e cuidado com a vida reprodutiva feminina.

“Seria melhor ter políticas públicas de proteção em vez de defender a descriminalização. Temos experiências de casas de acolhida que têm resultados positivos e menos traumáticos para essas mulheres. Achamos estranho levantar o aborto como conquista quando, na verdade, é um drama”, lamentou.

STF aprova restrição do foro privilegiado para deputados e senadores

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu hoje (3) restringir o foro por prorrogativa de função, conhecido como foro privilegiado, para deputados e senadores. Por 7 votos a 4, os ministros decidiram que os parlamentares só podem responder a um processo na Corte se as infrações penais ocorreram em razão da função e cometidas durante o mandato. Caso contrário, os processos deverão ser remetidos para a primeira instância da Justiça. O placar a favor de qualquer restrição foi unânime, com 11 votos.

No julgamento, prevaleceu o voto do relator, Luís Roberto Barroso, que votou a favor da restrição ao foro e foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux e Celso de Mello.

Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes também foram favoráveis à restrição, mas com um marco temporal diferente. Para os ministros, a partir da diplomação, deputados e senadores devem responder ao processo criminal no STF mesmo se a conduta não estiver relacionada com o mandato.

Durante o julgamento, os ministros chegaram a discutir se a decisão poderia ser estendida para demais cargos com foro privilegiado, como ministros do governo federal, ministros de tribunais superiores e deputados estaduais. A questão foi proposta pelo ministro Dias Toffoli, mas não teve adesão da maioria.

Como fica

Mesmo com a finalização do julgamento, a situação processual dos deputados e senadores investigados na Operação Lava Jato pelo STF e de todos os demais parlamentares que são processados na Corte deve ficar indefinida e as dúvidas serão solucionadas somente com a análise de cada caso. Os ministros terão que decidir individualmente se parlamentares vão responder, na própria Corte ou na primeira instância, às acusações por terem recebido recursos ilegais de empreiteiras para financiar suas campanhas. Ainda não é possível saber quantas processos serão afetados.

Segundo especialistas ouvidos pela Agência Brasil, a saída das ações da Corte para outras instâncias poderá acelerar o trabalho das duas turmas do STF, responsáveis pelo julgamento das ações.  Além disso, o atraso que poderá ocorrer no envio das ações à primeira instância será bem menor que a demora do Supremo para julgar os casos.

Segundo o projeto Supremo em Números,  da FGV Direito Rio, o tempo de tramitação de uma ação penal em 2016 foi de 1.377 dias, tempo maior que o registrado em 2002, quando o processo era julgado em aproximadamente em 65 dias.

Entre 2012 e 2016, das 384 decisões tomadas em ações penais, a declinação de competência, quando o parlamentar deixa o cargo e perde o foro no STF, representou 60% dos despachos, enquanto as absolvições chegaram a 20%. Condenações ficam em apenas 1%.