SUS vai incorporar antirretroviral como prevenção ao HIV

O Sistema Único de Saúde (SUS) vai começar a oferecer a profilaxia pré-exposição (PrEP) para grupos considerados de risco para exposição ao HIV. A estratégia consiste no consumo diário do medicamento Truvada – uma combinação do tenofovir com a entricitabina – por pessoas que não têm o vírus, mas que estão mais expostas à infecção, como profissionais de saúde, homossexuais, homens que fazem sexo com homens, pessoas trans e casais sorodiscordantes (um dos parceiros é soropositivo e o outro, não).

O anúncio foi feito hoje (24) pelo ministro da Saúde, Ricardo Barros, durante a 7ª Assembleia Mundial da Saúde, em Genebra, na Suíça. A PrEP deve passar a ser distribuída em até 180 dias após a publicação do protocolo clínico de diretrizes terapêuticas, prevista para a próxima segunda-feira (29). Na mesma data, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deve publicar a alteração do registro do Truvada, permitindo que ele seja utilizado no tratamento de pessoas infectadas pelo HIV e também de forma preventiva.

De acordo com Barros, com a medida, o Brasil se torna o primeiro país da América Latina a adotar a estratégia de prevenção como política de saúde pública. A PrEP já é utilizada em nações como Estados Unidos, Bélgica, Escócia, Peru e Canadá, onde é comercializada na rede privada, além de França e África do Sul, onde foi incorporada ao sistema público de saúde. O investimento inicial do governo brasileiro, segundo o ministro, será de US$ 1,9 milhão para a aquisição de 2,5 milhões de comprimidos. A quantia deve atender a demanda pelo período de um ano.

Prevenção combinada

A estimativa da pasta é que a estratégia no Brasil seja utilizada por cerca de 7 mil pessoas que integram as chamadas populações-chave, no primeiro ano de implantação. A diretora do Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais, Adele Benzaken, lembrou que a PrEP se insere como uma estratégia adicional dentro de um conjunto de ações preventivas que inclui a testagem regular, a profilaxia pós-exposição, a testagem durante o pré-natal e o uso de preservativo, entre outros.

Fazer parte de um dos grupos, segundo ela, não é o único critério para indicação da PrEP – será feita ainda, por profissionais de saúde, uma espécie de análise de vulnerabilidade do paciente, levando em consideração o comportamento sexual e outros contextos. A previsão é que, de imediato, a estratégia seja adotada em 12 capitais onde já há experiência nesse tipo de tratamento e, até o fim do primeiro ano de implantação, em todas as capitais brasileiras.

Estudos

As evidências científicas disponíveis, de acordo com Adele, demonstram que o uso de antirretrovirais pode reduzir o risco de infecção por HIV em mais de 90%, desde que o medicamento seja tomado corretamente, já que a eficácia está diretamente relacionada à adesão. A PrEP, entretanto, não substitui o uso da camisinha. “Não é um medicamento que se pode tomar de vez em quando. Tem que ser diariamente. E ele só começa a fazer efeito sete dias para exposição por relação anal e 20 dias para exposição por relação vaginal”, explicou.

HIV no Brasil

Dados do último boletim epidemiológico do ministério revelam que 827 mil pessoas vivem com HIV/Aids no Brasil atualmente. Desse total, 372 mil ainda não estão em tratamento, sendo que 260 mil já sabem que estão infectadas e 112 mil não sabem que têm o vírus. A aids, no país, é considerada uma doença estabilizada, com taxa de detecção em torno de 19,1 casos para cada 100 mil habitantes. Ainda assim, o número representa cerca de 40 mil novos casos ao ano.

Governo federal não aplicou mínimo em saúde em 2016

O governo federal não aplicou em 2016 o mínimo previsto em ações e serviços públicos de saúde. A denúncia é do Ministério Público de Contas de São Paulo que pediu ao MP Federal e ao Tribunal de Contas da União adotem as providências cabíveis.

De acordo com a denúncia, para cumprir o piso federal em saúde em 2016, de 15% da receita corrente líquida (RCL), a União deveria ter aplicado, no mínimo, R$ 108,3 bilhões. No entanto, segundo o documento, foi aplicado R$ 106,2 bilhões, aproximadamente R$ 2 bilhões aquém do exigido constitucionalmente.

Assinada pela procuradora Élida Graziane e pelo economista Francisco Funcia, a denúncia explica que a aplicação mínima em saúde é de 15%, conforme estipulado pela Emenda Constitucional 86/2015. Segundo os autores, esse mínimo chegou a ser alterado pela EC 95/2016, que previa uma regra de transição. Porém, o dispositivo foi revogado.

“A conclusão é que o piso federal em saúde se tornou 15% da RCL, sem qualquer escalonamento ou diferimento temporal com a entrada em vigor da EC 95, ou seja, em 15 de dezembro de 2016”, diz a denúncia.

No documento, os autores apontam ainda que não houve a compensação integral dos restos a pagar cancelados em 2015, como exige o artigo 25 da Lei Complementar 141/2012.

“Tais fatos, ao sentir dos representantes, como cidadãos, reclamam investigação imediata, haja vista o risco consistente de desrespeito às normas constitucionais e legais acerca do dever federal de aplicação mínima em ações e serviços públicos de saúde, bem como ao princípio constitucional de que ‘a saúde é direito de todos e dever do Estado'”.

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Exames com resultado normal são ‘desperdício’ para o SUS, diz ministro da Saúde

O ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que “80% dos exames de imagem no SUS (Sistema Único de Saúde) têm resultado normal” e que isso representa “desperdícios que precisam ser controlados”.

Barros participou na manhã deste sábado, em Cambridge (EUA). da Brazil Conference, evento sobre o Brasil organizado pela Universidade Harvard e o Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT). Em apresentação e posteriormente em entrevista à BBC Brasil, defendeu a necessidade de controlar a prescrição de exames.

“Temos que ter controle da demanda que os médicos fazem destes exames e passar a avaliar como utilizam sua capacidade de demandar do SUS. Se o médico solicita muitos exames que dão resultado normal, ele não está agindo de forma correta com o sistema”, afirmou Barros à BBC.

Segundo o ministro, exames de imagem (como tomografias e ultrassonografias) que não identificam problemas ou doenças sugerem que os médicos não estariam fazendo diagnósticos clínicos de forma correta.

Questionado se os exames precisam revelar problemas para serem considerados necessários, Barros disse que não quer interferir na capacidade de tomada de decisões dos médicos.

“Mas os medicos não podem pedir exame como forma de transferir sua responsabilidade de emitir diagnósticos”, afirmou.

“Os exames só devem ser usados quando há necessidade, não como rotina para diminuir a responsabilidade que o médico tem de fazer um diagnóstico a partir dos elementos clínicos.”

‘Tarefa impossível’

Durante sua fala na Brazil Conference, o ministro disse que os médicos da rede pública não estão atentos aos custos dos procedimentos que solicitam para seus pacientes.

“Temos muitos problemas em ajustar o médico como uma peça do sistema, e não como o centro do sistema. O médico tem uma visão que é fruto do compromisso que faz quando se forma, que é estar acima da questão pragmática, dos recursos.”

Ele explicou a fala à BBC Brasil. “Ao médico, cabe solicitar os meios para salvar uma vida, e ao gestor cabe disponibilizar aqueles que são possiveis de serem disponibilizados.”

“A integralidade não pode ser o ‘tudo do SUS para todos’. Eu sou gestor do SUS. Enquanto for tudo para todos, infelizmente, será uma tarefa impossivel.”

O ministro afirmou ainda que a ideia de integralidade (oferta irrestrita de exames e tratamentos) na rede pública atrapalha a universalidade (atendimento a todos os brasileiros) no SUS.

Desde que assumiu o cargo, em maio de 2016, Barros, que é deputado federal licenciado pelo PP do Paraná, vem defendendo o enxugamento de gastos do SUS, já que em algum momento o país não teria mais como bancar direitos que a Constituição garante, como acesso universal à saúde.

Nesse sentido, já se manifestou, por exemplo, a favor da criação de planos de saúde “populares”, mais baratos por oferecerem menos serviços do que a cobertura mínima prevista pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), Seria, segundo ele, uma forma de desafogar o sistema público e contribuir com o financiamento do SUS.

“É a integralidade, que é o atendimento integral do cidadão, contra a universalidade. O atendimento integral retira recursos que têm que ser aplicados no atendimento a todos os demais”, afirmou nos EUA.

‘Publicidade e eficiência’

Em sua fala de abertura, Barros disse à plateia formada também por médicos, defensores públicos, advogados e gestores de serviços de saúde que sua pasta preza pelo investimento em publicidade.

“Publicidade e eficiência são as marcas da minha gestão”, disse, sem informar valores.

Um dos principais projetos anunciados por Barros é a informatização do sistema público de saúde, proposta antiga mas nunca implantada no país.

“Investimos por ano US$ 230 bilhões em serviços públicos de saúde no Brasil”, disse Barros à BBC Brasil.

“Espero que, quando completada a informatização, economizemos 20% desses recursos, porque o médico, tendo todo o histórico de saúde do paciente, terá mais clareza (nos diagnósticos).”

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Oferta de leitos psiquiátricos no SUS diminuiu quase 40% em 11 anos

leitosa sus
As opções para atendimento psiquiátrico no SUS estão cada vez menores

O Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou hoje (21) levantamento em que mostra que o Sistema Único de Saúde (SUS) fechou 85 hospitais e quase 16 mil leitos psiquiátricos nos últimos 11 anos. Segundo a entidade, das 40.942 unidades psiquiátricas existentes em 2005, restavam 25.097 em dezembro de 2016, o que representa redução de 38,7% na oferta de leitos psiquiátricos.

De acordo com o balanço da entidade médica, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Minas Gerais perderam ao todo 13.500 vagas e apresentaram o maior índice absoluto de fechamento de leitos. Já em termos proporcionais, os estados com maior perda foram Tocantins, que registrou queda de 91% na oferta de leitos, Espírito Santo (78%) e Pernambuco (64%).

O documento aponta que houve redução de 37% no número de estabelecimentos que prestam serviços especializados em saúde mental. De 228 locais existentes em 2005, restaram 143 em dezembro do ano passado. O levantamento foi baseado em informações do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), que reúne os dados sobre estrutura física instalada nos estados e municípios, além de serviços disponíveis e profissionais vinculados ao sistema de saúde em todo o país.

Lacuna assistencial

Segundo o Conselho, o movimento de redução dos leitos psiquiátricos gera uma lacuna assistencial, já que aponta redução em um contexto de tendência de aumento populacional, registrada em 12% nos dois últimos anos. E também não supre a demanda crescente de pacientes com transtornos mentais, principalmente em decorrência do uso abusivo de álcool e drogas.

“Acredita-se que há 25 milhões de pessoas que necessitam de algum atendimento psiquiátrico, sendo que terão enorme dificuldade de contar com a integralidade da assistência, pois o governo, ao contrário de reforçar todas as etapas dos cuidados possíveis, adotou uma estratégia que prejudica aqueles que, em algum momento de sua história clínica, precisarão de um suporte hospitalar”, afirmou Emmanuel Fortes, 3º vice-presidente do CFM, que também coordenou a Câmara Técnica de Psiquiatria da autarquia.

Reforma psiquiátrica

O CFM explica que o fechamento das unidades é resultado de uma política promovida pelo governo federal de “sufocamento” do modelo de internação. A entidade argumenta que o movimento contrário à internação ganhou força com a adoção da Lei 10.216/2001, conhecida como reforma psiquiátrica.

De acordo com esta política, o atendimento psiquiátrico deve privilegiar a abordagem ambulatorial e terapêutica e evitar a internação dos pacientes. A reforma foi construída a partir de críticas à prática de isolamento e exclusão e às denúncias de maus-tratos ocorridos contra pacientes psiquiátricos internados de forma permanente e involuntária em diversas unidades manicomiais do país.

Desde então, o Ministério da Saúde vem gradativamente fechando manicômios e hospitais psiquiátricos e implantando a Rede de Atenção Psicossocial. Segundo o Ministério, a estratégia da rede é criar e ampliar os pontos de atenção à saúde mental no SUS, incluindo leitos em hospitais gerais, e promover atendimento livre, aberto e próximo à comunidade.

Implantação de alternativas

Entre as alternativas criadas pelo Ministério da Saúde para substituir os leitos estão os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), que oferecem atendimento comunitário a portadores de transtornos mentais e incluem, em algumas cidades, as modalidades de apoio a usuários de álcool e drogas, com estrutura de internação. Outra opção oferecida pela rede são as residências terapêuticas, que abrigam, sob a supervisão de uma equipe interdisciplinar, pacientes que saíram dos hospitais, mas não tem vínculo familiar nem para onde ir.

No entanto, o CFM destaca que o ritmo da instalação dos serviços alternativos não acompanha a proporção do fechamento dos leitos. Em todo o país, estão instaladas pouco mais de 10 mil alternativas comunitárias, enquanto foram fechadas 15.845 unidades de internação.

Papel da internação

O CFM e Associação Brasileira de Psiquiatria reconhecem que o modelo anterior, centrado na hospitalização, precisava de mudanças, mas defendem que a reforma deveria ser implementada de forma a humanizar o atendimento hospitalar, e não extingui-lo. As entidades analisam que, ao restringir a possibilidade de internação, o novo modelo desconsidera as necessidades dos pacientes em surto que precisam de acompanhamento intenso e, principalmente, daqueles que não têm mais qualquer vínculo familiar.

“É preciso entender que a doença psiquiátrica é como outra qualquer. Ninguém aconselha alguém infartado a ficar em casa esperando a dor passar. Por que, então, entende-se que um surto psicótico pode ser curado só com carinho, sem medicação? ”, argumenta o conselheiro federal pelo Piauí, Leonardo Sérvio Luz, que comanda o atendimento em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) na cidade de Uruçuí (PI).

Falta de leitos

Para regulamentar a questão, em 2015, foi editada uma portaria que define a disponibilidade mínima de um leito para cada 23 mil habitantes, o que representa 0,04 leitos para cada mil habitantes. O CFM aponta, contudo, que os cortes foram tão severos que deixaram alguns estados com o índice de leitos abaixo do mínimo estabelecido, como Espírito Santo e Roraima, que apresentam atualmente proporção de 0,03; Pará e Rondônia com 0,02 e Tocantins, onde a razão de leitos por mil habitantes não passa de 0,01.

A entidade argumenta que esta proporção é muito baixa e que o Brasil deveria voltar aos índices já adotados anteriormente, de 0,45, e poderia seguir a política adotada em outros países que têm modelos públicos parecidos com o SUS, como Inglaterra e Canadá. Os dois países citados apresentam média de 0,58 e 1,9 leitos de internação psiquiátrica por mil habitantes, respectivamente.

Despesas dos leitos psiquiátricos

No documento, o Conselho também traz a informação de que o valor da diária de manutenção de leitos psiquiátricos é insuficiente para pagar todas as despesas relacionadas ao tratamento. Segundo o CFM, as unidades que acolhem pacientes em situação de surto são mantidas com uma diária de R$ 26,91. Pesquisas apresentadas pela entidade estimam, contudo, que o valor da diária de serviços desta natureza deveria ser de pelo menos R$ 190.

O valor baixo das diárias reflete, segundo o estudo, uma tendência de redução significativa do orçamento federal destinado à assistência psiquiátrica, que previa um repasse de 6,3%, na década de 2000 e hoje não chega a 2%. O Conselho atribui a política de restrição a uma visão preconceituosa contra o papel do médico no processo de tratamento de doenças mentais. “Criou-se uma animosidade contra o hospital psiquiátrico, como se ele fizesse mal à saúde do doente mental. O que faz mal é um hospital sem médicos e sem condições de funcionar”, argumentou Emmanuel Fortes.