O impacto da transformação digital na saúde no mercado PME
Raphael Gordilho

 

Raphael Gordilho é Cofundador da Zaga

Nos últimos anos, a digitalização modificou diretamente diversos setores da economia. Na área da saúde, em especial, a pandemia acelerou o processo de transformação digital, viabilizando o desenvolvimento de novas tecnologias, enquanto soluções que já estavam na rotina médica foram aprimoradas. Neste sentido, serviços como telemedicina, prontuários eletrônicos, sistemas inteligentes, plataformas de prescrição digital, e-commerce de medicamentos e gestão de estoque e de suprimentos ganharam força e tornaram-se imprescindíveis no dia a dia das instituições de saúde.

 

Diante deste cenário, a criação de novas startups voltadas ao segmento cresceu na mesma velocidade em que os investimentos em saúde. De acordo com um levantamento realizado pela Sling Hub, plataforma que analisa dados de startups da América Latina, até o dia 30 de outubro de 2021, o setor de healthtechs captou 344,3 milhões de dólares em investimentos, um aumento de 329% em relação ao ano anterior. Mas, afinal, quais são os impactos que o processo de transformação digital na saúde traz para o mercado de pequenas e médias empresas (PME)?

Principais benefícios da digitalização da saúde no mercado PME

As vantagens da adoção de tecnologias na área da saúde são inúmeras. Por meio delas é possível obter diagnósticos mais precisos, redução de erros, precisão de informações, melhoria no atendimento hospitalar, além de viabilizar uma gestão mais eficiente.

Desta forma, as startups são capazes de desenvolver soluções disruptivas baseadas em tecnologias como Big Data, Inteligência Artificial e Armazenamento em Nuvem, por exemplo, que permitem aos gestores tomarem decisões mais assertivas, a partir de dados e informações precisas. Isto garante mais agilidade e soluções robustas o bastante para solucionar problemas complexos. Neste contexto, pequenas e médias empresas têm mais condições para concorrerem com grandes players do mercado.

O avanço da transformação digital na saúde contribui, ainda, para a democratização de soluções inteligentes, bem como o uso eficiente de suprimentos. Além disso, a digitalização promove a automatização de processos antes manuais, proporcionando a otimização de tempo e maior ganho de produtividade, garantindo, consequentemente, uma entrega mais qualificada para o público final.

O futuro da transformação digital na saúde

É fato que a pandemia causada pela Covid-19 despertou para pacientes, médicos, gestores e líderes de saúde um senso de urgência na aplicação de tecnologias no segmento. Neste contexto, as healthtechs têm como grande desafio promover, cada vez mais, a transformação digital nas pequenas e médias empresas.

A área de compras e estoque das PMEs, por exemplo, podem ser diretamente impactadas por healthtechs que promovem a digitalização deste segmento, uma vez que, ao utilizar um sistema que ajuda a tomar a decisão sobre o que comprar baseado em dados e modelos estatísticos, é possível reduzir a ineficiência de compras e diminuir, consequentemente, o desperdício de dinheiro parado.

A partir disto, o que veremos nos próximos anos para o mercado de PME é a continuidade e o fortalecimento de soluções de gestão, telemedicina e integração de sistemas, ajudando a consolidar soluções digitais que entregam benefícios aos empreendedores na mesma medida em que simplificam o dia a dia do público final.

Desafios e oportunidades da contabilidade no processo de transformação digital

A transformação digital está sendo discutida intensamente nas empresas com a promessa de ampliar a competividade, alavancar negócios e melhorar a experiência dos clientes. Apesar disso, há muito ainda a ser feito para incluir as áreas de contabilidade, que estão começando a ser envolvidas nesse processo de transformação.

De acordo com a pesquisa “Automação de relatórios financeiros e contabilidade técnica” da KPMG UK, as áreas de contabilidade e relatórios financeiros ainda estão operando em um modelo antigo de tecnologia. Essa afirmação fica clara quando observamos que mais de 50% dos respondentes informaram que usam planilhas eletrônicas e de texto no processo de preparação das demonstrações financeiras e somente uma minoria possui um software ou ferramenta em Nuvem para essas atividades.

O uso de tecnologia na contabilidade agiliza processos, aumenta eficiência, reduz erros e melhora a precisão da informação, fornecendo aos tomadores de decisão melhor embasamento nas suas decisões estratégicas. Quando a abordagem é baseada em análise de dados, identifica atributos e riscos, fornece informações preditivas, realiza análises automatizadas, previne erros e otimiza o processo de geração de informação.

Esses benefícios já estão começando a ser percebidos pelos profissionais da contabilidade, pois 90% dos entrevistados considera importante o processo de automação nas atividades de elaboração de relatórios financeiro e nas funções técnicas contábeis. Outro dado bastante interessante da pesquisa revela que uma grande parte dos profissionais planeja iniciar um processo automação nos próximos 2 anos.

Além dos benefícios já citados, outro ganho relevante para os profissionais e as empresas nesse processo de transformação digital é a possibilidade de investirem o seu tempo em atividades que geram valor ao negócio e desempenharem um papel mais estratégico dentro da organização.

Contudo, a entrada de novas tecnologias nas áreas contábil e de finanças, também impõe desafios. O primeiro diz respeito à disponibilidade de soluções efetivas, além disso, existem desafios relacionados a obtenção de orçamento para investimentos em ferramentas e conhecimento sobre como e, também, o que mudar dentro do processo de transformação digital das áreas de contabilidade e finanças.

Outro desafio depende do profissional contábil se adaptar para acompanhar o ritmo de alterações das normas contábeis, da tecnologia, demandando investimentos em recursos humanos no desenvolvimento de novas habilidades, já que a tecnologia vem transformando o perfil desse especialista.

Além dos desafios impostos, é importante que os profissionais de finanças tenham uma compreensão clara da estratégia de negócios e das expectativas de seus acionistas, bem como avaliem as oportunidades no contexto de suas atividades, considerando a automação de atividades repetitivas, uso de ferramentas analíticas, uso de tecnologias com alto potencial de processamento de dados, entre outros recursos.

Cabe ao diretor financeiro e aos líderes da função financeira mapearem esses pontos, as tendências da transformação digital, determinarem um plano e impulsionarem o processo. Em muitos casos, isso já começou — e é provável que acelere, dada a evolução que os entrevistados esperam ver em suas funções.

As tecnologias estão invadindo as áreas de contabilidade e finanças no Brasil em um caminho sem volta. A utilização de recursos como automação, análise de dados, inteligência artificial, robótica, computação cognitiva estão possibilitando uma redução significativa no tempo gasto em atividades manuais e rotineiras e potencializando o fator humano em atividades mais analíticas, fazendo com que os profissionais possam se antecipar as mudanças de cenário a partir dados preditivos somados a informação contábil, que é o principal instrumento dos tomadores de decisão.

A transformação digital está submetendo os profissionais de finanças e contabilidade a uma jornada desafiadora, uma vez que essa mudança extrapola iniciativas isoladas relacionadas exclusivamente a processos de negócios e implementação de novas tecnologias, mas, também, possui um forte viés na cultura e nas pessoas. As empresas que capitalizarem essa transformação e vencerem a batalha da transformação de dados em valor assumirão posições relevantes e terão a oportunidade de alavancarem novos negócios a partir do uso estratégico da informação contábil.

*Carmo Barboni é sócio-diretor da Prática de Consultoria Contábil da KPMG no Brasil