STF derruba liminares contra corte de energia em empresas na pandemia
Decisões foram dadas em pedidos apresentados por concessionárias do setor

 

Por Adriana Aguiar, do Valor Econômico

 

As concessionárias de energia têm conseguido derrubar, no Supremo Tribunal Federal (STF), liminares que impediam o corte de energia por falta de pagamento durante a pandemia da covid-19. As decisões beneficiavam empresas, principalmente indústrias, hotéis, bares e restaurantes, além de pessoas físicas, e valiam até o completo retorno da atividade econômica.

As liminares tinham como base a Resolução Normativa nº 878, editada em março do ano passado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A norma proibiu as concessionárias de cortar a energia de consumidores de baixa renda inadimplentes e de serviços essenciais. Foram concedidas com a justificativa de dar tratamento isonômico aos demais consumidores.

Somente a Companhia Energética do Rio Grande do Norte (Cosern) conseguiu derrubar oito decisões. Outras empresas do mesmo do grupo, como a Neoenergia Pernambuco, antiga Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), e a Neoenergia Brasília, também conseguiram julgados semelhantes.

De acordo com os advogados Rossana da Fonseca e Mateus Pereira dos Santos, do escritório Neves, De Rosso e Fonseca Advogados, que assessora a Cosern, as liminares, se mantidas, poderiam comprometer a eficiência dos serviços prestados pelas concessionárias, além de abrir possibilidade de aumento dos valores das tarifas pagas pela coletividade.

Boa parte das ações foi apresentada por entidades empresariais e defensorias públicas. Em algumas, buscava-se ainda o parcelamento das contas em atraso em até 12 vezes, bem como a suspensão de algumas cláusulas de contratos de fornecimento de energia elétrica.

Essas liminares tinham sido concedidas ou mantidas por Tribunais de Justiça. Para derrubá-las, as concessionárias de energia decidiram ir direto ao Supremo, com pedidos de suspensão de liminar ou de tutela provisória. Neles, alegaram que somente a Agência Nacional de Energia Elétrica pode regulamentar o tema e que o benefício não poderia ser estendido por atos legislativos ou por decisões judiciais.

“Somente a União, por meio da Aneel teria competência para normatizar questões relativas à energia elétrica”, diz Rossana da Fonseca, que assessora a Cosern. Para a advogada, o Poder Judiciário “não pode substituir o poder concedente, criando políticas públicas estranhas àquelas estabelecidas pelos outros poderes (Executivo e Legislativo), mesmo em momentos de calamidade pública”.

A primeira decisão favorável à Cosern no Supremo (STP 272) foi dada em recurso contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN) a favor da Defensoria Pública do Estado, no início da pandemia, para que não fosse suspenso o fornecimento de nenhum consumidor residencial e que fosse religada a energia de inadimplentes.

No caso da Cosern, todos os recursos foram analisados pelo presidente do STF, ministro Luiz Fux. Ele entendeu que as liminares concedidas poderiam causar “lesão à ordem administrativa e econômica em razão da insegurança jurídica no tratamento contratual estabelecida entre agentes econômicos e consumidores, reforçada pelo risco de se multiplicarem medidas semelhantes, o que justifica a intervenção da Suprema Corte”.

As decisões derrubaram ainda as liminares obtidas pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (STP 707), pelo Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado do Rio Grande do Norte (STP 690) e pela Casa Grande Mineração (STP409), entre outras.

A Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (Coelba) também conseguiu, no Supremo Tribunal Federal, suspender liminar contra corte de energia. A decisão, analisada pelo Pleno, foi obtida pelo Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Sul da Bahia (SL 1403).

Segundo o advogado da entidade, Ítalo Sampaio, o impacto da pandemia para os hotéis de Porto Seguro “foi alarmante, visto que tiveram que ficar inativos de março a setembro de 2020 e a retomada das atividades foi de forma gradativa com a liberação inicial máxima de 50% dos leitos”. Para ele, as consequências da pandemia trouxeram imprevisibilidades aos contratos firmados, impossibilitando o cumprimento fidedigno que foi acordado.

A Neoenergia Pernambuco e a Neoenergia Brasília foram outras concessionárias beneficiadas por decisões semelhantes do Supremo, em ações movidas por defensorias públicas (SL 1361 e STP 772, respectivamente).

Os advogados que assessoram a Coelba, Neoenergia Pernambuco e Neonergia Brasília, Adriana Catanho e Lucas Leonardo Feitosa Batista, do escritório Batista, Fazio, Manzi e Milet Advogados, afirmam que os pedidos não poderiam prosperar por tentar ampliar o alcance da norma da Aneel. “Não daria para generalizar porque esse efeito multiplicador pode estimular a inadimplência e prejudicar todo o setor, que poderia entrar em colapso”, diz Batista.

Adriana Catanho ainda relembra que a Aneel prorrogou a norma que prevê a suspensão dos cortes de energia para os menos favorecidos e serviços essenciais para o fim deste mês, conforme a Resolução nº 936.

Procuradas pelo Valor, a Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern) e as defensorias públicas dos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte e Distrito Federal não deram retorno até o fechamento da edição. Os advogados do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e similares do Estado do Rio Grande do Norte e da Casa Grande Mineração não foram localizados.