Muito se fala, e com propriedade, do imperativo de promover a reforma da Previdência Social, mas nem sempre se lembra que as mudanças demográficas que exigem alterações no sistema de aposentadorias e pensões também cobram ajustes em outros setores.
Um deles é o dos planos de saúde privados, como apontou o oftalmologista Claudio Lottenberg em entrevista a esta Folha.
Ele, que esteve à frente do hospital Albert Einstein e hoje preside a operação brasileira do grupo UnitedHealth, que controla a Amil, foi sucinto: “Vivíamos 40 anos e agora passamos para 80. Alguém precisa pagar essa conta”.
Com efeito, planos de saúde operam sob lógica análoga à dos seguros, que procuram diluir os custos das indenizações entre os clientes que contratam a apólice.
Quando se lida com fenômenos mais aleatórios, como num seguro contra incêndios, o mecanismo funciona de forma satisfatória. Quando se trata de saúde, entretanto, os riscos têm distribuição previsível: quanto mais avançada a idade, mais o contratante tenderá a utilizar o serviço –e em tratamentos, provavelmente, mais caros.
A agravar o problema, não apenas a população idosa aumenta em ritmo acelerado como também, devido à acentuada queda de fecundidade que o país experimentou, há cada vez menos jovens para dividir os custos dos contratos.
Hoje, o mercado de saúde privada opera com a proporção de dois jovens (até 18 anos) para cada idoso. De acordo com as estimativas do setor, essa razão deverá ser de um para um em dez anos.
Existe, ademais, um limite para o subsídio cruzado entre as faixas etárias. Se as mensalidades se tornarem elevadas em excesso, os consumidores de menor idade podem preferir contar com o SUS —dado que o risco de ficarem doentes é menor— a arcar com a certeza do rombo em seu orçamento.
Quanto seria razoável que os idosos pagassem a mais que os jovens? O debate tem graves implicações sociais, mas precisa ser travado com maturidade.
Outros temas relativos à saúde privada, aliás, demandam atenção. Como também mencionou Lottenberg, serão necessárias mudanças na forma de remuneração dos hospitais. O sistema em vigor, no qual se recebe por procedimentos realizados e dias de internação, não convida à otimização dos serviços.
Pelo contrário: o hospital aufere mais receita justamente com os pacientes que sofrem com maiores complicações —o que representa um desestímulo a evitá-las.
Sem enfrentar problemas como esses, planos de saúde, assim como aposentadorias, podem se tornar um artigo escasso no futuro.
Editorial da Folha de S. Paulo publicado na edição de 12/10/2017.