Hospitais têm alta de 20% nas internações em leitos clínicos
Oito em cada dez relataram ocupação acima de 80%; dados reiteram queda na faixa etária de internados

Balestrin alerta que cancelamento de cirurgias pode provocar agravamento de doenças nos próximos meses

 

Da Folha de S. Paulo

Os hospitais privados tiveram aumento de 20% nas internações em leitos clínicos para covid-19 nas últimas duas semanas, segundo levantamento do Sindicato dos Hospitais, Clinicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (SindHosp). Oito em cada dez hospitais apontaram ocupação superior a 80% nos leitos clínicos. Já nas UTIs, houve queda de 6% nos internados, conforme reporta a maioria das unidades.

Mas, com a pressão do sistema de saúde, metade das unidades relata cancelamento de cirurgias eletivas (não urgentes). Para Francisco Balestrin, presidente do SindHosp, o aumento das internações clínicas pode indicar que os casos estão chegando aos hospitais com menor gravidade. “Mas esse recuo de 6% nas internações em UTI não alivia a pressão sobre o sistema de saúde. Continuamos no limite”, afirmou. O estudo levantou as variações porcentuais, e não os números absolutos. A pesquisa foi realizada em 101 hospitais privados do Estado de São Paulo, que somam 4.089 leitos de UTI covid e 9.593 leitos clínicos para a doença.

Nas últimas semanas, o Brasil tem registrado aumento de novas vítimas do vírus, com média de óbitos superior a 2 mil por dia, o que reforçou um alerta sobre o relaxamento das medidas de isolamento social e a necessidade de acelerar a vacinação. Na opinião de Balestrin, outro grave problema indicado pela pesquisa se refere ao cancelamento de cirurgias eletivas.

“Ao todo,51% dos hospitais informaram cancelamento de cirurgias, sendo que, desses, 66% contabilizam o cancelamento de até 50% das cirurgias. A consequência será o agravamento e/ou cronificação de doenças nos próximos meses”, avaliou.

O trabalho do SindHosp mostrou ainda uma diminuição na faixa etária dos pacientes internados nos últimos 18 dias. Mais da metade, ou seja, 57% deles, têm entre 40 e 50 anos. Além disso, 32,29% dos pacientes têm entre 40 e 49 anos e apenas 19,77%, 60 anos ou mais.

Segundo o presidente do SindHosp, a redução pode ser associada à imunização contra a covid. Já sobre a duração do estoque de medicamentos utilizados nos procedimentos de intubação, 47% dos hospitais privados disseram ter capacidade para até um mês. Para 30% deles, o estoque de oxigênio possibilita a assistência, em média, entre 10 e 15 dias.

Sobre o “kit intubação”, 65% dos centros médicos detectaram aumento de preços dos medicamentos para essa finalidade para 79%, o reajuste foi superior a l00%.

Presidente da Anahp afirma que é preciso debater o financiamento da saúde

Setor precisa investir em qualidade, defendeu Balestrin

Na tarde de segunda-feira, durante a abertura do 1º Hospital Summit, o presidente do Conselho da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), Francisco Balestrin, afirmou que é importante o investimento em qualidade no setor e destacou que é necessário que se discuta o financiamento da saúde no país que, para ele,  é vital para o desenvolvimento de um setor mais acessível. “A saúde das pessoas deve ser a soma de todas as ações que fazemos no setor”, afirmou Balestrin .

A cerimônia de abertura reuniu importantes nomes do segmento, como  José Carlos Abrahão, diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que afirmou que “é a união dos players do setor que irá proporcionar uma revolução e o acesso da população à saúde”. Também estiveram no primeiro dia do evento o Ruy Baummer, representando a FIESP; Katherine Shibata, executiva da SAHE e Rodolfo More, presidente da Abclin.

Para promover este debate, o Hospital Summit foi estruturado em três salas simultâneas, totalizando mais de 50 horas de conteúdo divididos em sete eixos: perspectivas para a Saúde em 2017; engajamento no setor hospitalar; gestão de pronto-atendimento (PA); relacionamento sustentável com operadoras de planos de saúde; governança tático-operacional; eficiência operacional; e administração de fluxo de caixa e planos de negócios.

“Sabemos das necessidades de formação e especialização que atingem a nossa sociedade e, sobretudo, o setor de saúde. Por isso, temos o compromisso de contribuir de forma colaborativa com a discussão de temas importantes para o setor bem como promover a troca de experiências entre as entidades”, afirmou Balestrin.

O Hospital Summit acontece até esta quarta-feira (15) durante a South America Health Exhibition (SAHE),  no Centro de Eventos Pró Magno, na Zona Norte de São Paulo.

A realidade dos hospitais privados

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Francisco Balestrin

*Francisco Balestrin

Desde a fundação do primeiro hospital no Brasil, a Santa Casa de Misericórdia de Todos os Santos, inaugurada em 1543, manter uma unidade hospitalar nunca foi uma tarefa fácil, sempre exigiu dos gestores lidar com enormes desafios para preservar a sua sustentabilidade. A história conta que o primeiro hospital teve dificuldades para compor uma equipe médica, pois os profissionais não queriam sair da Europa para vir morar na colônia portuguesa recém-descoberta. Passados 515 anos, encontramos um cenário ainda mais desafiador para que a rede privada consiga manter um equilíbrio entre a sua própria saúde financeira e o dever de oferecer à população serviços de qualidade.

O que nos faz refletir se há algo a se celebrar no mês em que se comemora o Dia Nacional do Hospital. Oferecer os tratamentos e cirurgias mais avançados resulta em um custo que vem crescendo acima das receitas dos hospitais. São fatores como a elevação de custos, a pesada carga tributária, a intensa judicialização da saúde e o difícil relacionamento com os planos de saúde que traçam um cenário que está longe de ser animador para o setor hospitalar privado.

Seguindo a tendência dos últimos anos, as despesas hospitalares continuam aumentando acima da inflação geral. Uma das razões que explica os custos elevados é a alta carga tributária que incide sobre a saúde. Impostos municipais, estaduais e federais chegam a responder por um terço do valor pago por um serviço médico, o que impede que se tenham preços mais acessíveis. Como pode que o impacto dos impostos nos insumos de saúde no Brasil seja maior do que nas principais potências, como Estados Unidos e países europeus?

Não bastasse o desafio de conseguir investir em novas tecnologias com os altos impostos que incidem no setor, a alta do dólar impõe mais uma adversidade a ser enfrentada em um ano em que a economia do país apresenta números preocupantes. Boa parte dos materiais usados no dia a dia do hospital é dependente da importação de medicamentos e produtos, especialmente de países como Alemanha, Estados Unidos e China. Particularmente, o setor de gases medicinais ainda sofre com as elevações nas tarifas de energia elétrica, fazendo que os custos com gases medicinais mais que dobrassem em 2014.

É preciso que o país reconheça a importância da rede privada no sistema de saúde brasileiro. Somente os hospitais da ANAHP geraram, em 2014, mas de 114 mil empregos, realizaram mais de cinco milhões atendimentos no pronto-socorro e realizaram cerca de 700 mil cirurgias. Números que poderiam ser ainda maiores se houvesse um apoio dos governos municipal, estadual e federal. Mas pouco ou quase nenhum movimento se vê nesse sentido. Muito pelo contrário, os hospitais privados ainda sofrem com as dificuldades da rede pública. São cada vez mais frequentes ordens judiciais que obrigam hospitais privados a aceitar pacientes que não encontraram vaga na rede pública. O problema não é dispor o leito, mas a batalha enfrentada para conseguir que o Município, o Estado ou o Governo Federal quitem as despesas dos serviços prestados. Para um hospital pesa muito no balanço financeiro não receber por pacientes que, em uma UTI, tem custo médio de R$ 3 mil por dia.

Os hospitais ainda lidam com uma asfixia econômica provocada pelas operadoras de saúde. É uma relação desigual, na qual os gestores hospitalares veem a saúde financeira da instituição ficar cada vez mais debilitada sempre que um plano decide não pagar integralmente os custos do seu beneficiário. Há casos – e não são poucos – em que os hospitais não recebem nada do que deveria pelo atendimento realizado ao paciente com plano de saúde. Situação que não mudará enquanto permanecer o modelo atual de remuneração.

Poucos setores da economia brasileira enfrentam um cenário tão desafiador quanto o atual da rede hospitalar privada. O crescimento da expectativa de vida do brasileiro indica que continuaremos a ter um aumento da demanda por serviços de saúde. Mas, como investir na infraestrutura necessária se os recursos estão minguando? É uma questão que precisa estar na pauta do Ministério da Saúde e das secretárias estaduais e municipais. Sem esse diálogo, dificilmente teremos o que comemorar no ano que vem.

*Presidente da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp)

O futuro dos hospitais

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Francisco Balestrin

Francisco Balestrin*

Quando pensamos na entidade “Hospital”, pouco relacionamos esta atividade aos marcos sociais, políticos, econômicos e tecnológicos que moldaram a sociedade. Desde o período colonial, com o estabelecimento das Santas Casas de Misericórdia, até a Revolução Industrial, com a Reforma Sanitária e as mais recentes definições regulatórias, a evolução e o papel dos hospitais tiveram influência profunda nos valores culturais de cada época.

No início, a missão dessas instituições de saúde – baseada no modelo das Santas Casas – era  proporcionar o tratamento e sustento a enfermos e inválidos. Este modelo assistencialista passou por transformações ao longo dos séculos, e a estruturação do hospital como centro de cuidados especializados aconteceu entre o final do século XIX e início do século XX e, desde então, tem evoluído continuamente.

Hoje chama atenção a representatividade que estas instituições assumem no sistema de saúde brasileiro. A despesa total com saúde no Brasil representa 9,5% do PIB, e desse montante, 5,7% são gastos com internações e demais despesas assistenciais. Vale lembrar, ainda, que as atribuições dessas instituições vão além da assistência médica curativa e reabilitação, para serem reconhecidas pela colaboração na prevenção de doenças, no ensino e na investigação científica.

Gerir uma instituição de saúde, no entanto, pode ser um grande desafio. A governança hospitalar supera a de qualquer outra atividade econômica, exigindo um esforço intelectual, financeiro e tecnológico acima do padrão para atender uma realidade cada vez mais complexa.

Há, no Brasil, um processo de mudança, resultado de um novo padrão epidemiológico, dominado pelas multipatologias e a cronicidade, que requerem um enfoque organizacional integral, e que está sendo favorecido por uma série de fatores, como: a pressão pela eficiência econômica e sustentabilidade do sistema; as novas características do paciente, que se apresenta mais informado, participativo e exigente; a modificação do perfil do profissional e das profissões de saúde, com uma tendência ao trabalho multidisciplinar; e  a necessidade de melhoria da gestão e do monitoramento da qualidade dos serviços.

Esse contexto exige dos gestores investimento constante na ampliação das instalações, adaptação dos serviços, incluindo estrutura física e capacitação das equipes, bem como aquisição de novas tecnologias, com vistas a atender as demandas atuais. Isso tudo sem abrir mão do cuidado e da qualidade da assistência.

A verdade é que o papel do Hospital na sociedade ganhou novos contornos. Hoje, não é possível atribuir a essas instituições um papel isolado do restante do sistema, como acontecia com as Santas Casas na época colonial. É necessário pensar uma estrutura cada vez mais integrada, em redes de cuidado. Neste sentido, pela própria natureza da atividade, os hospitais têm muito a contribuir, pois são fortemente baseados em informação e conhecimento, e para isso investem em ferramentas que o auxiliam a identificar o perfil clínico da população que atendem e os resultados de seus processos de cuidado.

Certamente, ainda há muito para avançar. Os problemas enfrentados diariamente pelo sistema de saúde brasileiro estão longe de serem solucionados, mas as instituições de saúde estão empenhadas em buscar caminhos mais exitosos para o setor, na medida em que avançam em seus modelos de governança, cada vez mais estruturado no sentido de promover a melhoria contínua do nível de assistência e qualidade clínica do cuidado ao paciente, em um ambiente de boas práticas e de excelência.

Apesar dos novos paradigmas para a saúde, há um sentimento que prevalece desde os primórdios da assistência – os hospitais são instituições respeitadas e até reverenciadas pelo que representam para o bem mais precioso de uma pessoa, que é a saúde.

*Presidente da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp)