Gasto de empresas com plano de saúde não vai quebrar ninguém, diz Appy
Secretário extraordinário da Reforma Tributária diz que 'estão criando tempestade em copo d'água' nas discussões sobre o tema

Publicado inicialmente pela Folha de S.Paulo. Leia aqui.

O secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, em audiência no Senado (Foto: Agência Senado)

O secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, rechaçou, nesta sexta-feira (26), as críticas de alguns empresários sobre trecho da proposta que impede as empresas de aproveitarem o crédito do imposto pago nas despesas com plano de saúde.

“Quando eu pago o meu funcionário e ele compra um plano de saúde, ele vai ser tributado. [Quando] uma empresa do Simples contrata um plano de saúde para os seus funcionários, ela vai ser tributada e não vai ter crédito. Aí, uma empresa do regime regular contrata um plano de saúde e recebe o crédito. Por que eu tenho que desonerar o consumo de plano de saúde? Quem se beneficia do plano de saúde é o empregado e a família do empregado”, disse Appy em evento organizado pela Amcham (Câmara Americana de Comércio para o Brasil).

“Por que eu tenho que desonerar quando o plano de saúde é contratado por uma empresa do lucro real ou presumido e não desonero quando é contratado por uma empresa do Simples e não desonero quando é contratado pela pessoa física?”, acrescentou.

O secretário abordou o tema após ser questionado por um dos executivos que estavam na plateia de que a não utilização do crédito nesse caso causaria impactos na áreas saúde e maior pressão no SUS (Sistema Único de Saúde).

A reforma tributária tem como base a criação de um modelo de tributação chamado de IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que incide de forma não cumulativa, gerando um crédito para a próxima empresa na cadeia de produção. A empresa pode descontar o que já foi pago e recolher o imposto sobre a diferença.

Mas, no caso dos planos de saúde, as empresas não poderão aproveitar esse crédito, assim como gastos com seguro de vida.

Essa exclusão gerou críticas de vários executivos e é vista como uma das mais polêmicas do projeto de lei que regulamenta a reforma tributária apresentado pelo Ministério da Fazenda nesta semana.

Appy argumenta que a decisão de uma empresa de ofertar plano de saúde aos seus funcionários representa uma remuneração indireta; ou seja, sem ligação direta com a atividade da empresa.

Os tributos pagos na contratação de seguro contra acidente de trabalho, por outro lado, poderão ser abatidos no recolhimento da empresa, uma vez que têm a ver com a atividade exercida por ela.

“[Esse impedimento] não vai quebrar ninguém, vou ser bem claro aqui. Se hoje tem alguma distorção que gera uma vantagem competitiva para o plano coletivo, em detrimento do plano individual, essa distorção vai deixar de existir; esse é o princípio da neutralidade […] tenho certeza absoluta de que todo mundo vai continuar tendo direito ao plano de saúde”, disse Appy. Segundo ele, os críticos da medida “estão criando uma tempestade em um copo d’água”.

De acordo com a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), a impossibilidade de as empresas aproveitarem o crédito do imposto pago nas despesas com plano de saúde atrapalha o setor. “A gente está indo em sentido contrário do mundo. O mundo ou isenta ou coloca alíquota zero no plano de saúde quando se fala em IVA”, diz Gustavo Ribeiro, presidente da associação.

“O absurdo é que uma reforma tributária que visa desburocratizar, numa área tão sensível como é a área de saúde vem burocratizando e onerando mais. O norte deveria ser facilitar a vida do cidadão”, acrescenta.

Os planos de saúde, por sua vez, serão tributados em regime específico. A base de cálculo será uma espécie de margem, obtida a partir da diferença entre prêmios e contraprestações pagas pelos usuários e os gastos com cobertura.

A alíquota será a mesma aplicada aos serviços de saúde, equivalente a 40% da cobrança de referência. O governo estimou uma alíquota média de 26,5% —se confirmada, a alíquota reduzida ficaria em 10,6%.

O ministro Fernando Haddad (Fazenda) entregou ao Congresso Nacional nesta quarta-feira (24) a primeira proposta de regulamentação da reforma tributária (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)

Imposto Seletivo

Ainda no evento desta sexta, Appy disse que o imposto seletivo, que incide sobre produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, tem natureza extrafiscal e não arrecadatória.

“Ele é desenhado para ser extrafiscal; as pessoas não entenderam isso. Sessenta por cento da arrecadação do imposto seletivo, que é federal, vai para estados e municípios. Quem é que vai querer usar, com fins arrecadatórios, o imposto do qual ele tem o ônus de cobrar e fica com 40% da arrecadação? Não faz sentido querer usar o imposto seletivo para fins arrecadatórios”, afirmou.

O governo incluiu no escopo desse tributo a aquisição de veículos, aeronaves e embarcações. Para o Executivo, a inclusão se justifica porque eles são “emissores de poluentes que causam danos ao meio ambiente e ao homem”.

Empresários, porém, temem que o imposto incida mais de uma vez sobre um mesmo bem ao longo da cadeia produtiva, gerando possível cumulatividade. O moderador do evento da Amcham, por exemplo, questionou Appy sobre a possibilidade de o aço utilizado na produção de um veículo ser alvo do imposto, assim como a venda do próprio veículo.

“A incidência é monofásica, agora mineral é uma coisa, carro é outra. Quem colocou os minerais na base do imposto seletivo foi o Congresso Nacional. Foi o Senado Federal e foi mantido na Câmara dos Deputados. Não foi o governo que colocou isso, nunca defendemos isso”, disse o secretário.

Uma proposta de revolução na residência médica
Iniciativa quer reduzir desigualdade na distribuição de residentes médicos entre as regiões do Brasil

Publicado inicialmente no Blog Receita de Médico, do Globo. Leia aqui.

Médico usando computador (Freepik)

O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), desde a sua fundação, tem sido um bastião de pioneirismo na medicina brasileira. Reconhecido como o primeiro hospital a implementar um programa formal de residência médica no Brasil, em 1944, o HCFMUSP estabeleceu um modelo de formação médica que viria a ser replicado por todo o país. Desde então, não apenas formou milhares de médicos especialistas como também atuou como núcleo para a expansão e diversificação dos programas de residência médica em várias especialidades. Atualmente, o hospital oferece 54 programas de residência médica, que juntos somam 883 vagas anualmente credenciadas pela Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM).

Em uma proposta que visa aprimorar o Decreto 11.999, de 17 de abril de 2024 que regulamenta a CNRM, a Universidade de São Paulo traz uma iniciativa inovadora, reconhecendo a importância dos centros formadores, que são 789 instituições credenciadas com 41.853 vagas de residência ocupadas hoje. Essa proposta leva em conta a desigualdade na distribuição de residentes médicos entre as regiões do Brasil, que é um tema complexo, marcado por discrepâncias em termos de acesso, qualidade da formação e oportunidades profissionais. Ela também leva em conta o fato de que os maiores centros formadores estão vinculados a hospitais universitários.

Esses dois polos estão integralmente considerados na proposta, uma vez que tanto os centros formadores de residentes em grandes cidades e vinculados a hospitais universitários quanto aqueles situados em áreas mais remotas e economicamente desfavorecidas desempenham um papel crucial na formação profissional. Esses centros estão intrinsecamente ligados às demandas do Sistema Único de Saúde (SUS) e à promoção da saúde, visando atender às necessidades específicas de cada região brasileira.

Com isso em mente, esta iniciativa sugere critérios claros para a inclusão desses centros na CNRM: o número de residentes formados e a representação de todas as regiões do país. A sugestão é ambiciosa: incluir oito novos membros, ampliando o total para 21, representando os centros formadores através dos programas de residência com mais vagas e garantindo uma distribuição equitativa por região. A distribuição considera a atual distribuição de vagas no país, visando uma representatividade abrangente: Sudeste (4 membros titulares e 4 suplentes), Sul (1 membro titular e 1 suplente), Nordeste (1 membro titular e 1 suplente), Norte (1 membro titular e 1 suplente), e Centro-Oeste (1 membro titular e 1 suplente). Além disso, prevemos incluir dois membros dos centros formadores na composição da Câmara Recursal, para agregar contribuições técnicas e experiências práticas ao SUS.

Ao incluir esses centros na CNRM, reconhecemos não apenas sua relevância, mas também seu papel fundamental na formação de profissionais capacitados e comprometidos com a melhoria dos serviços de saúde e a promoção do bem-estar da população. Essa ampliação da representatividade na CNRM é um passo importante para garantir que as políticas de residência médica sejam mais inclusivas, equitativas e eficazes em atender às necessidades de formação dos profissionais.

Por meio dessa abordagem colaborativa e refinada, deveremos fortalecer a representatividade e a qualidade dos processos de credenciamento, regulação, supervisão e avaliação dos programas de residência médica, alinhados com as necessidades e realidades regionais do SUS e do Brasil.

Professores da FMUSP que participaram deste artigo: Carlos Gilberto Carlotti Jr, Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfá, Paulo Manuel Pêgo Fernandes, Ludhmila Abrahāo Hajjar, Edivaldo Utiyama, Giovanni Guido Cerri, Tarcísio Eloy Pessoa de Barros Filho, Linamara Rizzo Battistella, Roberto Kalil Filho.

Governo avança na melhora de cuidados paliativos no SUS
Serviço é iniciado com criação de política nacional para o setor

Da Agência Brasil

O Conselho Nacional de Saúde, que monitora e fiscaliza as políticas públicas do setor no país, aprovou a criação da Política Nacional de Cuidados Paliativos (PNCP) no Sistema Único de Saúde (SUS). A resolução, publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira (15), dá início à estruturação do serviço em todo o país.

Definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como “direito humano e imperativo moral de todos os sistemas de saúde”, os cuidados paliativos são o conjunto de serviços essenciais que melhoram a vida de pacientes – e seus familiares – que “enfrentam desafios associados a doenças com risco de vida e graves sofrimentos relacionados à saúde, incluindo, mas não se limitando, a cuidados no fim da vida.”

Em 2023, o Ministério da Saúde iniciou debate com a sociedade e os gestores de estados e municípios sobre a criação de uma estrutura de cuidados paliativos em todo o país. Uma proposta para a política pública foi inscrita na plataforma Brasil Participativo e recebeu mais de 11,4 mil votos, tornando-se a 4º mais votada na área da saúde.

A iniciativa resultou em um pacto para a efetivação da proposta, estabelecido entre as diferentes esferas do Poder Público (municipal, estadual e federal) durante a 12ª reunião de 2023 da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), ocorrida em Brasília no mês de dezembro.

Com a implantação da política pública, o governo espera aproximar o serviço ofertado no país às orientações dos organismos internacionais na atenção à qualidade dos serviços de cuidados paliativos, que recomenda a disponibilização de uma equipe de assistência domiciliar e uma equipe de nível hospitalar para cada 100 mil habitantes.

De acordo com o Ministério da Saúde, para a implantação da estrutura serão investidos R$ 851 milhões ao ano em iniciativas como a capacitação de 1,3 mil equipes especializadas e assistência farmacêutica para prevenção e alívio de sofrimento e sintomas, avaliação e tratamento da dor. Dessa forma, o governo espera mapear, sistematizar e ampliar os serviços já ofertados na estrutura do SUS.

Dados divulgados pela OMS em 2021, mostram que há uma estimativa de que mais de 56,8 milhões de pessoas, incluindo 25,7 milhões no último ano de vida, necessitam de cuidados paliativos no mundo, sendo que 78% dessa necessidade está concentrada em países de baixa e média renda.

No Brasil, segundo o último relatório da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), divulgado em 2019, existiam apenas 191 serviços de cuidados paliativos em atividade, sendo 96 na estrutura do SUS. Desse total, 106 estão localizados na Região Sudeste, 33 na Região Sul, 26 no Nordeste, 20 no Centro-Oeste e apenas 7 na Região Norte.

Para o Ministério da Saúde, a falta de um sistema de credenciamento para serviços já ofertados, como equipes especializadas em hospitais gerais e de tratamento do câncer, centros de Atenção Oncológica (CACONs) e programas como o Melhor em Casa, resultaram em contagem inferior à realidade. Essa subnotificação deverá também ser sanada com a implantação da PNCP.

“Com a implementação do credenciamento, será possível obter um panorama mais preciso do que o SUS dispõe para a área e poder garantir que mais pacientes que necessitam do cuidado tenham acesso a ele de forma adequada e eficiente”, diz o ministério em nota.

Inteligência Artificial no SUS será tema de palestra global sobre câncer

Segunda maior causa de mortes no mundo, o câncer tira a vida de mais de 10 milhões de pessoas anualmente segundo dados da OMS, ficando atrás apenas dos problemas cardiovasculares. Para conscientizar sobre o inevitável aumento no número de casos e promover soluções, a London Global Cancer Week, patrocinada pelo Institute of Cancer Research, em Londres, vai reunir os principais oncologistas e pesquisadores do mundo para debates e palestras no mês de novembro. O evento contará com a participação do brasileiro Daniel Herchenhorn, coordenador científico do Oncologia D’Or, que vai apresentar, à distância, dados inéditos sobre o uso da Inteligência Artificial no Sistema Único de Saúde brasileiro.
Amanhã (14 de novembro) o oncologista apresentará dados que refletem a desigualdade no diagnóstico e tratamento da doença de próstata no Brasil, refletindo no diagnóstico tardio e nos diferentes tratamentos ofertados. Os dados de mais de 700 mil pacientes estão sendo coletados e tabelados por Inteligência Artifical de forma a facilitar sua leitura e permitir um estudo mais detalhado sobre como mudar o cenário no país e no mundo. “A ideia é que, no futuro, possamos analisar esses dados em outros tumores e assim consigamos debater como resolver essa desigualdade”, destaca Herchenhorn.
Daniel Herchenhorn, do Oncologia D’Or.