Após dois dias de audiência pública para debater mudanças na metodologia para o reajuste dos planos de saúde individuais, promovida nesta terça e quarta-feira (24 e 25) pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), operadoras e agência reguladora não chegaram a um consenso.
Segundo a ANS, o objetivo é analisar todas as propostas apresentadas e “chegar a uma metodologia que traga mais transparência, previsibilidade e objetividade ao cálculo do reajuste”. Cerca de 180 pessoas participaram dos dois dias de evento, entre representantes do setor, de órgãos de defesa do consumidor e da sociedade.
A ANS apresentou o resultado de um estudo feito desde 2010. Pela proposta da agência, o Fator de Reajuste Anual dos Planos Individuais ou Familiares do setor de saúde suplementar (FRPI) será calculado levando em conta o Fator de Variação dos Custos Médico-Hospitalares do universo dos Planos Individuais (VCMH), o Fator de Variação de Faixa Etária (FFE) e o Fator de Variação de Produtividade (FGP), todos podendo ser calculados por entidade externa “mediante acordo de cooperação prévio estabelecido com a ANS”.
A minuta proposta pela agência está disponível no site da ANS.
FenaSaúde
Para a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), entidade que reúne 19 operadoras de planos de saúde com 24,4 milhões de beneficiários (34,8% do mercado brasileiro), o controle de preços leva à escassez de produtos. Segundo a presidente da entidade, Solange Beatriz Palheiro Mendes, não existe política boa de controle de preços. “É preciso deixar o mercado atuar livremente, propiciando total transparência nos custos de toda a cadeia, para que os próprios consumidores possam avaliar e tomar decisões em relação aos produtos e serviços ofertados.”
A federação defende a diferenciação por porte e por nível de plano para a Variação do Custo Médico-Hospitalar (VCMH) e que o Fator de Produtividade proposto pela ANS seja calculado por entidade externa especializada. A FenaSaúde propõe que seja adotado o modelo americano, “que combina um percentual autorizado com uma sinistralidade teto”. “As empresas que extrapolarem o limite de sinistralidade poderão aplicar um reajuste individualizado, com base na sua estrutura de custos”, informou a entidade por meio de nota.
A ANS informou que vai consolidar todas as contribuições em um documento a ser disponibilizado na internet, sem necessariamente aprovar uma mudança na metodologia. O reajuste dos planos individuais impacta mais de 8 milhões de beneficiários de planos. No mês passado, foi autorizado o reajuste em 10%, após uma disputa judicial.
Rodrigo Aguiar defende a manutenção do índice de 40%
Apesar da recente decisão da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, de suspender liminarmente a regra que fixa em até 40% o pagamento de exames e consultas em planos de saúde de coparticipação, o diretor de Desenvolvimento Setorial da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Rodrigo Aguiar, continuou a defender, em entrevista à Agência Brasilpor e-mail, a manutenção do índice. “Não há razões técnicas que justifiquem a alteração do índice. A ANS está segura quanto à adequação do percentual definido”, disse.
Aguiar disse que a competência da agência para editar a Resolução Normativa nº 433, que trata do assunto, foi balizada pela Advocacia-Geral da União (AGU), que analisou previamente a proposta. O diretor comentou ainda sobre recente polêmica envolvendo o papel da ANS: a função de agências reguladoras, segundo ele, é promover o equilíbrio do setor, sem atuar em prol de um único público.
Confira a entrevista:
Agência Brasil: Em sua decisão, a ministra Cármen Lúcia diz que a ANS não tem “a devida competência” para regulamentar mecanismos de regulação financeira e que o assunto deveria passar pelo Congresso, já que envolve o direito à saúde. Na avaliação do senhor, a agência extrapolou sua competência ao editar a matéria?
Rodrigo Aguiar: A avaliação quanto à legalidade e/ou competência da ANS para editar determinada norma é realizada pela Advocacia-Geral da União (AGU), que, como faz em todos os normativos editados pela ANS, analisou previamente, em três oportunidades, a proposta de norma que culminou com a publicação da RN n° 433/18 e não identificou qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade na atuação da agência reguladora.
Agência Brasil: O instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) classificou a Resolução Normativa nº 433 como “retrocesso” e acusou a ANS de expandir “de maneira irresponsável” os limites de coparticipação em planos. A agência esperava tamanha reação por parte da sociedade e do próprio Judiciário?
Rodrigo Aguiar: As críticas não procedem. O processo para normatização da coparticipação e franquia seguiu integralmente o rito para participação dos mais diversos públicos de interesse, com várias oportunidades diferentes (grupo de trabalho, câmara técnica, audiência pública, consulta pública e pesquisa para tomada de subsídios) para que o setor, representantes da sociedade civil e a população em geral, registrassem sugestões e críticas antes da definição da norma. Esta foi, inclusive, uma das normas editadas pela ANS que mais teve discussões com a participação de representantes da sociedade.
Os representantes de entidades de defesa do consumidor sugeriram cerca de 140 contribuições à normativa, das quais 74 foram totalmente ou parcialmente acatadas pela ANS. Somente o Idec teve 15 propostas totalmente ou parcialmente atendidas pela reguladora durante o processo. Em números gerais, a consulta pública sobre o tema recebeu 1.177 contribuições da sociedade e a pesquisa pública contou com 645 contribuições.
É totalmente equivocada a afirmação sobre “expansão de maneira irresponsável” dos limites de coparticipação. Tais mecanismos existem há mais de 20 anos sem qualquer limite imposto às operadoras. Hoje, são aplicados percentuais de 50%, 60%, 70%. A norma determinou um teto de 40%. Além disso, definiu limites – mensal e anual – para a cobrança pelas operadoras, protegendo efetivamente o orçamento dos consumidores, impedindo que estes sejam surpreendidos com cobranças excessivas. Ressalta-se que atualmente, na vigência da Consu n° 8 de 1998, não há qualquer limite estabelecido, de modo que as operadoras têm total liberdade para aplicar os valores e percentuais que lhe sejam convenientes nos contratos com os consumidores.
Ademais, merece destaque a previsão contida na RN n° 433/18, através da qual a ANS determinou ainda isenção de cobrança para mais de 250 procedimentos, entre eles quimioterapia, radioterapia e hemodiálise.
Ou seja, a partir destas informações, fica claro que as únicas novidades criadas pela ANS a partir da edição da RN n° 433/18 foram para proteger e defender o consumidor, conferindo-lhes previsibilidade e segurança.
Agência Brasil: Antes da resolução, não havia definição de um percentual máximo para coparticipação em cada atendimento, mas a ANS orientava as operadoras a não praticarem valores superiores a 30%. Por que ampliar o índice para até 40% agora?
Rodrigo Aguiar: É preciso esclarecer que nunca houve nenhuma norma da ANS estipulando o limite de cobrança em 30% ou em qualquer outro percentual. Também não é verdade que a ANS orientava as operadoras a manter a prática dos valores em 30%. Vários documentos preparatórios e preliminares foram construídos pela ANS ao longo do tempo no intuito de definir o percentual máximo a ser determinado para a cobrança de coparticipação e nestes documentos foram sugeridos percentuais distintos a partir de critérios também distintos, partindo de 30% a 50% ou até mesmo defendendo a não estipulação de um percentual máximo, para que os casos fossem analisados conforme suas circunstâncias. Contudo, nenhum desses percentuais tinha sido definido oficialmente pela ANS até a edição da RN 433/18, a qual fixou o limite máximo em 40%.
Com o percentual estabelecido na RN nº 433, as operadoras passam a ter um limite de cobrança que antes nunca houve, protegendo o consumidor. O percentual estipulado, fundamentado em diversos estudos, leva em conta um valor capaz de estimular a utilização consciente e racional do plano, sem, contudo, resultar em um valor excessivo a ponto do beneficiário deixar de buscar o atendimento efetivamente necessário.
Esse limite máximo, aliado aos demais limites que reduzem os riscos aos beneficiários (limite de exposição financeira, isenção de cobrança em diversos procedimentos e concessão de bônus e descontos aos beneficiários como forma de incentivo aos bons hábitos de saúde e rotinas de prevenção), acaba por reduzir os impactos financeiros para o consumidor, que também passa a saber, de antemão, que o máximo que irá pagar – caso use o plano – será o mesmo valor da mensalidade.
Isso se fizer uma utilização muito intensa do plano de saúde naquele determinado mês. Caso sua utilização seja eventual, somente receberá a cobrança relativa à realização daquele determinado procedimento ou da utilização de determinado serviço, estando limitado, no caso da coparticipação, por percentual, a 40% do seu valor. Exemplo: se realizar uma consulta de R$ 70, pagará, no máximo, R$ 28.
Já a inclusão de mais de 250 procedimentos e eventos em saúde isentos de cobrança de coparticipação e franquia vão beneficiar, por exemplo, muitos pacientes crônicos e idosos, que não poderão ter cobrança em exames preventivos (mamografias, citologia oncótica e glicemia de jejum, por exemplo); para tratamentos como hemodiálise, quimioterapia e radioterapia; exames pré-natal e exames de triagem neonatal, além da realização de quatro consultas por ano com médico generalista.
É importante destacar que, nos produtos registrados na ANS e que estão disponíveis para comercialização, os planos com coparticipação e franquia são, em média, de 20 a 30% mais baratos do que planos sem coparticipação e franquia, havendo casos de reduções maiores, de 40%, por exemplo.
Agência Brasil: A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) chegou a chamar de “abusivo” o percentual de cobrança de até 40%, por parte de beneficiários, em casos de planos de saúde de coparticipação e franquia. Há possibilidade da ANS reverter o índice?
Rodrigo Aguiar: Reafirmo que a definição do percentual de 40% para cobrança de coparticipação (que deve ser sempre cumulado com o limite de exposição financeira mensal e anual do consumidor) foi feito com base em estudos técnicos aprofundados, bem como em análises da aplicação de coparticipação e franquia em sistemas de saúde de outros países, como exaustivamente demonstrado no relatório de análise de impacto regulatório disponível no site da ANS.
Assim, a ANS está segura quanto à adequação do percentual definido, de modo que não encontra razões técnicas para promover uma alteração já neste momento, em que a norma aprovada não está nem em vigor (por estar em período de vacância e por estar suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal).
Contudo, por total, absoluto e incontestável respeito e submissão aos Poderes Judiciário e Legislativo, bem como aos demais órgãos de controle de sua atuação regulatória, caso qualquer destes proferir decisão determinando a alteração de tal percentual, a ANS o fará prontamente, como não poderia deixar de ser.
Por fim, é relevante destacar que o percentual definido pela ANS é um percentual máximo. As operadoras poderão, como medida de concorrência no setor, comercializar produtos com percentuais mais baixos ou sem a adoção dos mecanismos, garantindo que as empresas ofertem diferentes produtos e atendam diferentes perfis e necessidades do consumidor, que terão seu poder de escolha ampliado.
Agência Brasil: A Lei nº 9.961/2000, que criou a ANS, diz que o órgão tem como finalidade institucional “promover a defesa do interesse público” na assistência suplementar à saúde. Recentemente, o senhor declarou que a agência não é um órgão de defesa do consumidor. Não parece uma contradição?
Rodrigo Aguiar: O que eu disse quando falei essa frase, que foi descontextualizada nas chamadas de imprensa, foi que o papel das agências reguladoras é promover o equilíbrio do setor. Não é atuar em prol de um público somente, mas de todos os atores que fazem parte dessa relação.
O consumidor é o elo mais vulnerável do mercado regulado, por isso deve ter seu atendimento devidamente respaldado e seus direitos protegidos. Essa é a função primordial da ANS e de qualquer outra agência reguladora. Mas, para atender esse fim, a reguladora precisa garantir que o setor esteja em equilíbrio, para que a prestação do serviço ao consumidor seja adequada e qualitativa.
Assim, esclareço que, dentro deste contexto, afirmei que a ANS não é um dos órgãos que compõem o sistema nacional de defesa do consumidor, mas mantém relação muito aproximada com este a fim de observar os interesses e direitos dos consumidores.
Os planos de saúde fazem parte do setor que mais recebeu reclamações de consumidores direcionadas ao atendimento do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Segundo o levantamento divulgado hoje (12), os contatos relacionados a operadoras de saúde somaram 23,4% do total em 2017. O setor fica no topo do ranking pelo terceiro ano consecutivo, sendo responsável por 28,06% das queixas em 2016 e por 32,7% em 2015.
Segundo o Idec, a maior parte das reclamações dos consumidores vem sobre o reajuste abusivo dos planos, especialmente empresariais e coletivos. Além disso, tem incomodado os usuários as negativas de cobertura e falta de informações sobre os planos.
O Idec recebeu em 2017 um total de 3,8 mil chamados com reclamações e dúvidas.
Em segundo lugar no ranking das reclamações ficaram as queixas relativas a compra de produtos, com 17,8%. O setor ultrapassou o ramo dos serviços financeiros, que ficou em terceiro no levantamento deste ano, com 16,7%, mas vinha ocupando a vice-liderança das queixas nos dois anos anteriores. A maior parte dos problemas está relacionado a problemas com cartão de crédito, conta corrente e crédito pessoal. Em relação à compra de produtos, a maior parte das reclamações tinha a ver com defeitos e descumprimento nas ofertas.
Os serviços de telecomunicações, incluindo telefonia móvel e fixa e TV por assinatura, ficaram como o quarto mais questionado nos contatos com o Idec. Do total, 15,8% das ligações foram motivadas pela relação com essas empresas. A TV por assinatura é a maior fonte de reclamações, seguida pelos problemas com telefonia e internet.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta (7) manter a validade de uma lei do Mato Grosso do Sul que obriga as operadoras de plano de saúde a justificar, por escrito, ao consumidor, os motivos para negar autorização para procedimentos médicos. Por unanimidade, a Corte seguiu voto proferido pela relatora do caso e presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, a favor da competência da Assembleia Legislativa do estado para legislar sobre o tema.
O questionamento sobre a norma chegou ao Supremo por meio de um recurso protocolado pela União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas). A entidade alegou que somente o Congresso Nacional pode legislar sobe o assunto e impor obrigações em casos que envolvem planos de saúde privados. O entendimento firmado pelo STF deverá basear o julgamento de outras ações sobre assistência médico-hospitalar.
Crítica
Ao final da sessão desta manhã (7), o ministro Marco Aurélio criticou a produtividade das sessões extras da Corte, agendadas para o período matutino. O ministro disse que não há quórum para as deliberações e ainda cobrou da presidente da Corte, Cármen Lúcia, que combine com os colegas o agendamento das sessões. A sessão teve duração aproximada de uma hora. A partir das 14h, os ministros voltam a se reunir na sessão vespertina, como ocorre todas as quartas e quintas-feiras.
“Talvez, presidente, precisemos repensar essas sessões matutinas, porque na maioria das vezes, não temos quórum, e voltarmos a tradição de combinarmos essas sessões”, disse o ministro.
Ao rebater a crítica, Cármen Lúcia afirmou que foram julgados seis ações diretas de inconstitucionalidade. “Farei isso, ministro. De toda sorte, nesta sessão nós tivemos o julgamento de um número razoável de processos.”